O sistema judiciário brasileiro, como se sabe, infelizmente é extremamente moroso e sobrecarregado. Os processos tramitam por longos anos, a pauta de audiências nas varas é lotada e a tão esperada sentença demora bastante tempo para ser proferida pelo juízo competente.
De acordo com o relatório mais recente do "Justiça em Números" do CNJ — o de 2021— [1], o tempo médio entre o ajuizamento de uma demanda de conhecimento na vara estadual (primeiro grau) até a prolação da sentença é de dois anos e cinco meses.
Projetar esse cenário no âmbito do Direito de Família nos permite inferir uma série de dificuldades causadas por essa morosidade às partes envolvidas no processo, como o longo tempo de espera para a concessão do divórcio ou decretação do fim de uma união estável.
Por consequência, nos últimos anos houve um expressivo movimento para a criação de leis que tornaram possível a utilização de meios extrajudiciais para a solução de questões do Direito de Família nas quais não há lide. A primeira delas foi a Lei nº 11.441/07, que permitiu a realização da separação e divórcio consensuais no cartório por meio de escritura pública, desde que observados alguns requisitos.
Além disso, a famosa PEC do Divórcio — a Emenda Constitucional nº 66/2010 — reconheceu o direito potestativo ao divórcio, ou seja, que esse é um direito direto e imotivado do possuidor, não admite contestações. Em outras palavras, para que haja o divórcio, basta que um dos cônjuges deseje pôr fim à relação e o outro nada poderá fazer além de aceitar.
Assim, atualmente, o ordenamento jurídico brasileiro permite que, se observados os requisitos de ausência de filhos incapazes ou nascituros, presença de um advogado e consenso entre as partes, é possível a concessão do divórcio ou a decretação do fim da união estável por meio de escritura pública em cartório de registro civil. Um procedimento mais rápido e menos custoso.
Paralelamente a isso, no ano de 2019 alguns tribunais, como o de Pernambuco e o do Maranhão, visando a reduzir ainda mais a burocracia e privilegiar a autonomia das partes (como o direito potestativo ao divórcio), editaram provimentos que passaram a permitir a averbação do divórcio unilateral na via extrajudicial, o que até o momento era permitido tão somente na via judicial.
Em síntese, de acordo com o que previam os referidos provimentos, o cônjuge que desejasse se divorciar poderia fazer o requerimento no próprio cartório, acompanhado de advogado ou defensor público, o outro cônjuge seria apenas notificado e a averbação seria realizada, enquanto as demais questões (alimentos, guarda e outras tutelas) deveriam ser discutidas na via judicial.
Ocorre que o corregedor nacional de Justiça à época determinou a revogação dos provimentos e recomendou que os Tribunais de Justiça se abstivessem de editar atos nesse sentido, fato este que, com a devida vênia, vai de contrapartida ao amplo movimento doutrinário e jurisprudencial que visa à desburocratização nas demandas de família.
A fim de solucionar o impasse provocado pela revogação dos aludidos provimentos estaduais, foi proposto pelo Senado Federal o Projeto de Lei nº 3457/2019, que visa a acrescentar o artigo 733-A ao Código de Processo Civil e, com isso, permitir o divórcio unilateral extrajudicial nos casos em que inexistirem filhos incapazes ou nascituros.
De acordo com esse artigo, seria permitido em âmbito extrajudicial tão somente a averbação e a troca de nome do cônjuge para retomar o nome de solteiro, o que ocorreria cinco dias após a citação (pessoal ou editalícia) do outro cônjuge.
Em suma, esse é um procedimento rápido, simples e sem burocracia que facilitaria a solução pela via administrativa no cartório de registro de pessoas naturais, evitando o desgaste e a morosidade do Poder Judiciário, nos casos em que um dos cônjuges discorde do pedido de divórcio.
Desse modo, atualmente o ordenamento brasileiro permite tão somente o divórcio pela via administrativa nos casos em que houver o consenso de ambos os cônjuges, ausência de filhos incapazes ou nascituros e mediante a presença de advogado ou defensor público.
Com o crescente avanço dos atos que visam à desburocratização e ao desafogamento do Poder Judiciário, a esperança é que o projeto de lei ora mencionado seja aprovado e o divórcio unilateral na via administrativa, finalmente colocado em prática.
__________
[1] https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2021/11/relatorio-justica-em-numeros2021-221121.pdf.
*Sarah Carolina Rodrigues de Mesquita é advogada especialista em Direito Processual Civil com atuação humanizada voltada para o Direito de Família.
Fonte: ConJur
Leia mais...O convênio para disponibilização do serviço é uma iniciativa da Anoreg/RS e do Fórum de Presidentes das entidades notariais e registrais do RS
Nesta sexta-feira (03.12) é celebrado o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, data que busca informar e conscientizar a população sobre a importância e direitos da pessoa com deficiência. Desde 1º de setembro deste ano, os Cartórios do Rio Grande do Sul associados a uma entidade notarial ou registral gaúcha passaram a disponibilizar à população surda e muda o Sistema de Intérprete de Libras, que viabiliza o atendimento por meio da integração entre um funcionário do cartório a um intérprete de Libras que estará disponível por videochamada.
“Os registradores e notários, associados de uma das entidades, possuem hoje em suas serventias para o atendimento presencial o Sistema de Intérprete de Libras, garantindo assim um tratamento digno aos cidadãos surdos”, aponta o presidente da Associação dos Notários e Registradores do Estado do Rio Grande do Sul (Anoreg/RS), João Pedro Lamana Paiva.
Na prática, cada cartório, por meio de um login e senha, ou QR code, irá entrar em contato com o intérprete da central de tradução simultânea ICOM Libras – que viabiliza a comunicação entre pessoas surdas e ouvintes – por meio da internet quando um deficiente auditivo necessitar de atendimento.
Para o presidente do ICOM Libras, Cid Torquato, “a Resolução 401, do Conselho Nacional de Justiça, é muito clara ao promover o acesso da pessoa com deficiência ao Judiciário. Meus parabéns à Anoreg/RS por ter resolvido o atendimento à comunidade surda com os serviços ICOM Libras muito antes do prazo estabelecido, dando o exemplo a todo o país”.
O convênio é uma iniciativa da Associação dos Notários e Registradores do Estado do Rio Grande do Sul (Anoreg/RS) e do Fórum de Presidentes das entidades notariais e registrais do RS, atendendo à determinação do Provimento nº 001/2021, da Corregedoria Geral da Justiça do Rio Grande do Sul (CGJ-RS), que regulamenta a acessibilidade para surdos e mudos nos serviços notariais e de registro do Estado.
Fonte: Assessoria de Comunicação – Anoreg/RS
Leia mais...O PL altera o CPC para permitir o
procedimento extrajudicial, hoje vedado pela legislação em separações que
envolvam menores e nascituros.
Todo casal deve ter direito ao
divórcio, à separação ou à dissolução de união estável pela via extrajudicial,
mesmo que tenha filhos menores ou que a mulher esteja grávida. Esta é a opinião
do IAB - Instituto dos Advogados Brasileiros que, na sessão ordinária
virtual da última quarta-feira, aprovou por unanimidade o parecer do relator
Thiago Nicolay, da Comissão de Direito Civil, favorável ao PL 731/21, de autoria do deputado federal
Kim Kataguiri (DEM/SP).
O PL altera o CPC para permitir o procedimento
extrajudicial, hoje vedado pela legislação em separações que envolvam menores e
nascituros. "A proposta é legal e constitucional, desburocratiza o
procedimento e só traz benefícios aos filhos menores e aos seus genitores",
afirmou o relator na sustentação oral do seu parecer.
Conforme o projeto, o fim da
relação formal poderá ocorrer pela via extrajudicial, desde que o caso seja
previamente apreciado pelo MP. Caberá ao órgão autorizar a dispensa do caminho judicial.
"O novo CPC, que entrou em vigor em 2015, se adequou completamente ao
texto constitucional, ao dispor que o Ministério Público atuará na defesa da
ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses e direitos sociais e
individuais indisponíveis", destacou Thiago Nicolay. O advogado
ressaltou também que o CPC, especificamente em relação às ações de família,
"determinou que o MP será intimado a intervir como fiscal da ordem
jurídica em processos judiciais que envolvam interesse de incapaz".
Thiago Nicolay comentou a hipótese
em que, ainda conforme o CPC, a via extrajudicial hoje é possível, mas a
atuação do MP permanece indispensável: "Pela legislação em vigor, há a
possibilidade de realização do divórcio de forma extrajudicial mesmo que o casal
tenha filho menor ou nascituro, desde que as questões relativas aos incapazes
sejam antes dirimidas em processo judicial específico".
De acordo com o advogado, a
determinação procedimental exigida pela lei compromete a celeridade. "Na
prática, muitos casos de divórcio consensual acabam indo parar no Poder
Judiciário, prejudicando as partes envolvidas, já que os processos judiciais
relativos aos incapazes têm tramitação lenta, além de sobrecarregar a própria
máquina judiciária", disse.
O relator reconheceu a importância
da participação do Judiciário e do MP, mas relativizou a sua necessidade:
"Embora a interpretação comum seja a de que a judicialização e a
consequente intervenção do MP visam a proteger os direitos da criança e do
adolescente, também é possível traçar um panorama em que tal imposição traz
prejuízos para os menores, por sua exposição a um processo moroso e que
potencializa ambientes conflituosos".
Ao argumentar em defesa da
aprovação da iniciativa legislativa, Thiago Nicolay também disse: "O PL
não busca uma transação extrajudicial realizada às escuras e sem participação
ministerial, mas somente a simplificação dos processos de divórcio, separação e
dissolução de união estável de forma consensual, garantindo a desjudicialização
da solução de conflitos e a redução de prejuízos emocionais e psicológicos a
todos os envolvidos".
Fonte: Migalhas
Titular do 2º Tabelionato de notas de Sacramento/MG
desde 2002, Samuel Araújo conversa com a Academia Notarial Brasileira sobre seu
livro recém-lançado, “A Santa Sé como um estado e proprietária de imóveis no
Brasil”, obra que traz a debate as características da pessoa jurídica da “Santa
Sé” e como as mesmas influenciam na realização de atos para transferências de
imóveis.
O autor é Bacharel em direito pela Faculdade de
Direito de Franca (FDC), além de ser mestre em Direito das Relações
Econômico-Empresariais e doutor em Direito pela PUC-SP. O livro pode ser
adquirido pelo site da YK Editora. Clique aqui e acesse.
ANB – Quais
assuntos são tratados pela obra? Qual a abordagem escolhida?
Samuel Luiz Araújo – A obra trata da propriedade imobiliária da
Igreja Católica Apostólica Romana no Brasil, instituição eclesiástica
indissociável da pessoa jurídica de direito público externo denominada Santa
Sé. Parte-se da premissa de que a Santa Sé é um Estado na ótica do Direito
Internacional e da opção política do direito brasileiro que veda a aquisição de
bens por Estado estrangeiro.
ANB – De
forma sucinta, como a obra estuda a existência de personalidade jurídica à
Cidade do Vaticano e à Igreja Católica?
Samuel Luiz Araújo – Parte-se dos postulados de Direito Internacional
no tocante ao reconhecimento de Estados e de governos, situações distintas no
Direito das Gentes. Analisando-se o ordenamento jurídico da Santa Sé e os
tratados e concordatas por ela celebrados, conclui-se que internacionalmente,
isto é, no concerto com outros Estados (e aqui se inclui o Brasil), ela é
conhecida como Santa Sé, ao passo que a Cidade do Vaticano é preferida para
tratar das suas situações internas.
ANB – De
que forma tais entidades, dadas suas características, realizam transações
imobiliárias no Brasil? Como tais características se transpõem à realidade e ao
extrajudicial brasileiro?
Samuel Luiz Araújo – Eu começo a introdução da obra com o caso do
pároco que compareceu em cartório e solicitou a lavratura de uma escritura de
procuração. Já vigia o Decreto 7.107, de 2010, que promulgou o tratado
celebrado entre a Santa Sé e a República Federativa do Brasil, pelo qual as
instituições eclesiásticas se submetem ao ordenamento jurídico brasileiro, mais
especificamente ao registro, segundo dispõe o art. 3º, § 2º, do Acordo. O
pároco havia apresentado uma documentação irregular para o fim almejado, motivo
da qualificação negativa. No entanto, ao ser indagado do objeto da procuração,
disse: “para ingressar com despejo do arrendatário”. Essa propriedade foi
adquirida por meio de um legado deixado para a paróquia. Acredito que o número
de propriedades adquiridas por esse meio seja expressivo.
Quanto à segunda questão, os notários devem verificar
a regularidade da representação da pessoa jurídica quando da prática de atos de
seu interesse. Quanto à aquisição imobiliária, está só pode dar-se para a
promoção do culto da fé ou para a promoção de ações assistenciais.
ANB – Na
visão do senhor, como atos extrajudiciais, em exemplo a realização de uma
Escritura de Compra e Venda feita em tabelionato de Notas, conversam com as
corretas denominações que a Santa Sé venha a ter?
Samuel Luiz Araújo – O correto é observar as prescrições do registro
da pessoa jurídica, conforme dispõe o art. 3º, § 2º, do Tratado promulgado pelo
Decreto 7.107/2010, cuja leitura é recomendável ao se lavrar atos de interesse
da Santa Sé.