Inicialmente faz-se imprescindível uma análise minuciosa da
documentação tributária, registral e societária que envolvem as pessoas dos
sócios, dos imóveis a serem integralizados e da sociedade.
1. Introdução
A análise sistemática quanto às questões de fato e de
direito que envolvem a problemática voltada a integralização de bens imóveis na
pessoa jurídica deve passar pelo detalhamento dos trâmites societários,
registrais e estratégias fiscais, na busca das melhores alternativas para a
estruturação dos procedimentos.
Destarte, inicialmente faz-se imprescindível uma análise
minuciosa da documentação tributária, registral e societária que envolvem as
pessoas dos sócios, dos imóveis a serem integralizados e da sociedade, bem como
das questões de fato e de direito que se mostrarem pertinentes no caso concreto,
para que assim seja possibilitada a construção da melhor linha estratégica para
a condução da regularização registral e integralização dos imóveis no capital
social da pessoa jurídica, a partir de suas consequências fiscais, societárias
e demais questões relativas aos demais aspectos jurídicos envolvidos nos
procedimentos.
2. A integralização do capital por meio de imóveis e o
devido procedimento no registro de imóveis
Em primeiro lugar, há que considerar que a integralização do
capital por meio de bens imóveis deve ser acompanhada do devido procedimento no
registro de imóveis, pois em se tratando de bem imóvel, para a incorporação do
bem à sociedade empresarial, há que se observar, detidamente, os ditames do
art. 1.245 do Código Civil1.
Certo pois que, o registro do título translativo no Registro
de Imóveis se apresenta como condição imprescindível à transferência de
propriedade de bem imóvel entre vivos, propugnada pela lei civil, não se
confundindo, tampouco podendo ser substituído para esse efeito pela
publicização do contrato social. De fato, a inscrição do contrato social no
Registro Público, destina-se, primordialmente, à constituição formal da
sociedade empresarial, conferindo a essa personalidade jurídica própria,
absolutamente distinta dos sócios dela integrantes.
Por este viés, em sede de julgamento de Recurso Especial -
REsp 1.743.088, a 3ª turma do Superior Tribunal de
Justiça entendeu que a constituição de sociedade empresarial, com a
integralização do capital social por meio de imóveis indicados por sócio, não é
suficiente para operar a transferência da propriedade nem para conferir à
empresa legitimidade para promover embargos de terceiro destinados a afastar
penhora sobre os bens. Segundo o colegiado, para se tornar válida, necessário
que a transferência seja realizada via registro de imóveis2.
Nesse sentido, a integralização do capital social da empresa
pode ocorrer por meio da cessão de dinheiro ou bens, sendo necessário observar
o modo pelo qual se dá a transferência de titularidade3. Naquele julgamento,
assinalou-se que o estabelecimento do capital social, assim compreendido como
os recursos a serem expendidos pelos sócios para a formação do primeiro
patrimônio social, necessários para a constituição da sociedade, e o modo pelo
qual se dará a sua integralização, consubstanciam elementos essenciais à
confecção do contrato social (art. 997, III e IV, do Código Civil).
3. Da declaração de atividade predominante da sociedade
como meio de se evitar a incidência de ITBI
Portanto, diante da exigência legal consolidada pela
jurisprudência, em se transferir para a sociedade a propriedade do imóvel
perante o competente Registro de Imóveis, há de ser considerado, quando da
transferência das propriedades, que os municípios solicitam uma declaração, ou
uma apresentação de documentação inicial que comprove que as atividades da
empresa não são predominantemente imobiliárias, justamente pela ressalva feita
no § 2º, I, do art. 156 da Constituição Federal4, que exclui da hipótese de
imunidade, as transferências realizadas a adquirentes cuja atividade
preponderante for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens
imóveis ou arrendamento mercantil.
Tal exigência decorre do fato de o ITBI possuir uma
imunidade específica, cuja hipótese se dá quando da transmissão de bens ou
direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de
capital, e sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação,
cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade
preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos,
locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil, por força do § 2º, I, do
indigitado art. 156 da CF. Assim, torna-se interessante diante do caso
concreto, que os sócios optem por realizar o capital social da sociedade
mediante a integralização de imóveis, aproveitando-se da imunidade.
4. Da maior segurança jurídica em se integralizar os
imóveis como capital social em detrimento da integralização como patrimônio
líquido
Ainda que o texto expresso da Constituição Federal evidencie
que a operação de transmissão de imóveis ao patrimônio de pessoa jurídica em
realização de capital é imune (para fins de ITBI), quando a atividade
preponderante da pessoa jurídica não for imobiliária, independentemente se
parte do valor aportado for destinado para a conta de reserva de capital, se
mostra com maior segurança jurídica, a integralização dos imóveis como capital
social em detrimento da integralização como patrimônio líquido.
É possível se constatar tal assertiva no entendimento do
Supremo Tribunal Federal, quando em sede de repercussão geral no julgamento do
RE 796.376/SC5, decidiu que incide Imposto de Transmissão
de Bens Imóveis (ITBI) na integralização de imóveis ao patrimônio de pessoas
jurídicas nos casos em que o valor do imóvel exceder o (valor do) capital
social integralizado.
Veja-se que a Constituição Federal não faz qualquer menção à
proporção entre o valor do imóvel que foi ou será transferido e o capital
social da sociedade que recebeu ou receberá o imóvel. O requisito principal
para o reconhecimento da imunidade está relacionado à preponderância da
atividade, calculada com base na receita operacional da pessoa jurídica.
Assim, se um imóvel for transferido por uma operação de
aumento de capital para uma pessoa jurídica, a operação de integralização não
estará sujeita ao ITBI, dada a imunidade prevista na Constituição Federal.
Todavia, conforme entendimento exarado, caso os valores referentes aos imóveis,
se destinados para a conta de reserva de capital que compõe o patrimônio
líquido da sociedade, a diferença estaria sujeita ao ITBI.
Logo, se chega à conclusão de que a integralização de bem
imóvel à sociedade empresária, por segurança jurídica, deve preferencialmente
ser transferido a título de capital social, pois se um imóvel for transferido
para o aumento de capital para uma pessoa jurídica, a integralização não estará
sujeita ao ITBI, mas se integralizado como patrimônio líquido poderá sofrer a
incidência, conforme entendimento da nossa suprema corte.
5. Da correta determinação dos valores dos imóveis a
serem integralizados como meio de se evitar o ganho de capital
Não restam dúvidas quanto a imunidade tributária referente
ao ITBI prevista na Constituição Federal, todavia, além disso, necessária se
faz a correta determinação dos valores dos imóveis a serem integralizados como
meio de se evitar, quando possível, o ganho de capital, que incidirá na
cobrança do respectivo tributo, incidindo sobre a diferença entre o valor
originário e o valor final após a transferência.
A respeito do ganho de capital, o artigo 23 da lei 9.249/956,
assim dispõe: "as pessoas físicas poderão transferir a pessoas jurídicas,
a título de integralização de capital, bens e direitos pelo valor constante da
respectiva declaração de bens ou pelo valor de mercado" (caput).
"se a entrega for feita pelo valor constante da
declaração de bens, as pessoas físicas deverão lançar nesta declaração as ações
ou quotas subscritas pelo mesmo valor dos bens ou direitos transferidos"
(parágrafo 1º). Por outro lado, "se a transferência não se fizer pelo
valor constante da declaração de bens, a diferença a maior será tributável como
ganho de capital" (parágrafo 2º).
Para se evitar o ganho de capital é cediço, portanto, que,
as transferências dos imóveis para as pessoas jurídicas devem ser feitas pelo
valor constante da declaração de imposto de renda (faculdade prevista no artigo
23 da lei 9.249/95). Pois, o imóvel detido pela pessoa física deixa de constar
em sua declaração, passando a constar cotas/ações de sociedade pelo mesmo valor
do imóvel. Não há ganho para a pessoa física, que apenas "troca" um
bem pelo outro.
6. Conclusão
Posta assim a questão, possível se revela concluir que, na
hipótese de integralização de imóveis no capital da pessoa jurídica, a
necessidade de se buscar as melhores alternativas em termos de tomada de
decisão deve contemplar obrigatoriamente os aspectos societários, tributários e
registrais. Além disso, devem ser elencados critérios de tempo e fiscais,
sempre sob o prisma da segurança jurídica, visando assim adotar um planejamento
a partir da análise dos riscos na tomada de decisões, para que ao fim, seja
definida a melhor estratégia para a resolução da problemática que demandará a
análise pormenorizada do caso concreto.
Fonte: Migalhas