A regulação e a aplicação ativa das leis são aspectos
primordiais para o combate da corrupção sistêmica nas instituições. Essa foi a
premissa do debate que reuniu nessa segunda-feira (23/11) atores do sistema de
combate à corrupção e ao crime organizado em painel do webinário Estratégias
Globais para Reduzir a Corrupção – Como e por que compliance importa,
promovido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Durante o painel “A necessidade da aplicação ativa da lei”,
o diretor-executivo da Transparência Internacional no Brasil, Bruno Brandão,
destacou que a regulação e a aplicação da lei perpassam pelo entendimento de
que corrupção deve ser entendida como parte de um sistema do Estado e que tem
relação direta com a sociedade e o mercado. “O cenário está relacionado com a
incapacidade de aplicação da lei. E nesse cenário o que ocorre é que a grande
parcela da base social brasileira tem poucas garantias de acesso à Justiça e de
defesa dos seus direitos, enquanto a impunidade prevalece nos seus setores mais
altos.”
Brandão citou levantamento da própria Transparência
Internacional, na qual consta que o Brasil é uma das nações com pior desempenho
no Índice de Percepção da Corrupção (IPC). “No Brasil houve uma piora na
percepção da corrupção nos últimos anos justamente porque o país não deu um
passo efetivo para lidar com as raízes da corrupção sistêmica. Para tratar das
raízes desse problema a solução penal sempre será insuficiente. Temos que
atacar os marcos legais institucionais que permitem essa corrupção sistêmica.”
O país está com 35 pontos no ranking da entidade, valor mais
baixo desde 2012, ano em que o índice passou a permitir a leitura em série
histórica. A escala do IPC vai de 0 a 100, na qual 0 significa que o país é
percebido como altamente corrupto e 100 significa que o país é percebido como
muito íntegro.
Para o promotor de Justiça Christiano Gonzaga, o problema na
regulação e aplicação da lei em casos de corrupção é sistêmico e favorece ao
crime do colarinho branco. Gonzaga explica que esse tipo de crime possui uma
tríplice proteção, feita dentro do que intitulou “Direito Penal do Amigo”. Nele,
a corrupção é protegida na elaboração das leis, na falta de estrutura do
sistema dos controles sociais formais e na própria percepção da sociedade, que
se preocupa com o crime que a afeta diretamente no seu cotidiano. “O combate ao
crime de colarinho branco necessita de uma estruturação, de uma formação de
ideias, de uma ótica mais contundente. Os crimes do colarinho branco promovem
uma morte silenciosa que não conseguimos ver.”
Injustiça social
O professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
(USP) Eduardo Saa-Diniz trouxe uma reflexão de como a corrupção corporativa tem
reflete no contexto de injustiça social e nos direitos humanos. Para ele as
práticas sociais de compliance poderiam mobilizar seus recursos para
capacitação democrática e certo de contas histórico com a sociedade.
“No Brasil são 58 milhões de pessoas vivendo na linha da
pobreza extrema. Nós temos mais que uma Argentina vivendo em pobreza extrema
aqui. Temos que nos perguntar como esses recursos podem impactar na comunidade
de seu entorno. Temos que oferecer métricas cientificamente validadas para
aquilo que realmente importa para a vida das pessoas e daquilo que expressa uma
gestão democrática da forma como fazemos negócios”, afirmou.
O termo compliance consta da Resolução CNJ nº 309,
que em março deste ano fixou as Diretrizes Técnicas das Atividades de Auditoria
Interna Governamental do Poder Judiciário – DIRAUD-Jud, uma regulamentação da
atividade de auditoria interna, com princípios, conceitos e requisitos
fundamentais. Compliance é traduzido no artigo 25 da norma como
“auditoria de conformidade”, que tem como objetivo “avaliar evidências para
verificar se os atos e fatos da gestão obedecem às condições, às regras e aos
regulamentos aplicáveis”.
O procurador federal da Argentina Patrício Sabadini
ressaltou que as grandes empresas desempenham uma função nos serviços públicos
direta ou indiretamente, e que elas devem passar por procedimentos regulatórios
democráticos com o Estado aplicando penas criminais. Ele explica que um dos
mecanismos pode ser a figura do “denunciante” (whistleblower), especificamente
para casos de denúncias de irregularidades e crimes dentro das corporações. “As
grandes empresas já alcançaram um papel fundamental visto que elas gerem parte
das funções públicas. O Estado pode e deve regulamentar. Organizar
um compliance requer uma cultura de compliance. E na
materialização desses programas é necessária a implantação de canais adequados
de denúncia.”
Reveja o evento aqui.
Fonte: Conselho Nacional de Justiça