A especialista em
Direito da Família do escritório Romano, Raunaimer e Frank, Anatércia Romano,
explica como funcionam os regimes de bens e a situação da herança em cada um
Ninguém casa pensando
em se separar. No entanto, a possibilidade precisa ser considerada. Segundo o
Colégio Notarial do Brasil (CNB), só nos primeiros meses de 2022, o Brasil já
registrou mais de 17 mil divórcios. No ano passado, foram concluídas mais de 80
mil separações consensuais, o maior número desde 2007. Então, é bom se planejar
antes mesmo do casamento para evitar dores de cabeça na questão “quem fica com
o que?”, e para isso, é preciso escolher um regime de bens.
Essa é uma norma que
vai determinar as relações econômicas entre os cônjuges durante o casamento. A
especialista em Direito da Família do escritório de advocacia Romano, Raunaimer
e Frank, Anatércia Romano, explica os cinco regimes de bens: comunhão parcial
de bens, comunhão universal de bens, separação convencional de bens, separação
obrigatória de bens e participação final nos aquestos.
Saiba como funciona
cada um deles:
Comunhão parcial
(Código Civil, art. 1.658)
Atualmente, esse é o
regime ‘padronizado’ pela lei. Ou seja, se o casal não escolher outro regime,
este será aplicado.
Na comunhão parcial,
são partilhados os bens adquiridos durante o matrimônio, excluindo aqueles que
já pertenciam a cada um dos parceiros antes da união.
“Contudo, essa é uma
regra geral, pois existem exceções”, frisa a advogada. “Não se partilham bens
que sejam considerados instrumentos de trabalho de um dos cônjuges, mesmo que
adquiridos após o matrimônio”, exemplifica.
Mas como fica a
herança? De acordo com a comunhão parcial, os filhos herdam 50% do patrimônio
que o casal constituiu durante o casamento. O viúvo concorre com os filhos quanto
ao patrimônio particular do falecido.
Comunhão universal de
bens (Código Civil, art. 1.667)
Antes da comunhão
parcial, o que era de um era de outro e vice-versa. A comunhão universal de
bens era o regime padrão no Código Civil anterior, de 1916, por isso,
casamentos mais antigos são regidos pela comunhão universal.
Nela, todo o
patrimônio de cada um dos cônjuges passa a ser do casal, não importa se foi
adquirido antes ou durante do casamento e se obtido a título gratuito ou
oneroso.
Este regime também
possui exceções. Segundo Anatércia, o exemplo mais comum são os bens herdados
ou doados por um dos cônjuges com a famosa ‘cláusula de incomunicabilidade’.
Essa cláusula determina que o cônjuge do herdeiro não recebe os bens herdados,
não importando o regime do casamento. O bem se torna ‘incomunicável’.
“Do ponto de vista
sucessório, no regime da comunhão universal, tendo em vista que o cônjuge tem
direito a metade de todo o patrimônio do falecido, ele não é herdeiro”, explica
Anatércia.
Separação
convencional ou total (Código Civil, art. 1.687)
Esta é considerada a
opção mais simples. A regra é uma só: o patrimônio dos cônjuges não é
compartilhado, sem exceção.
No caso de herança,
já que o cônjuge não tem direito a metade, todo o patrimônio é dividido entre
ele e os filhos. “Ou seja, neste regime o percentual recebido pelos filhos é
maior”, explica Anatércia.
Então, entra a
questão: o que acontece quando os cônjuges, juntos, adquirem um bem durante o
casamento? De acordo com a advogada, eles serão co-proprietários.
“Em caso de divórcio
esse bem não é partilhado, cada qual já é dono de sua quota parte. Em caso de
óbito, o sobrevivente será herdeiro do falecido, dividindo a herança com
descendentes ou ascendentes, conforme o caso”.
Separação obrigatória
(Código Civil, art. 1.641)
Ao contrário dos
regimes mencionados anteriormente, a separação obrigatória não depende da
escolha do casal. Ele é um regime imposto pela lei em determinadas
circunstâncias. Por exemplo: pessoas com mais de 70 anos que desejam casar são
obrigadas, legalmente, a aderir a este regime.
“Essa regra já
levantou muita polêmica, por alguns acharem ser discriminatória com as pessoas
com mais de 70 anos. Tamanha a polêmica que o STF editou a súmula 377 que
dispõe que os bens adquiridos na constância do casamento, sob o regime da
separação obrigatória, devem sim ser divididos”, conta Anatércia. Além disso,
do ponto de vista sucessório, o cônjuge sobrevivente não é herdeiro.
Outra situação em que
a pessoa é obrigada a casar por esse regime é quando o divorciado ou viúvo
ainda não fez partilha de bens e se casa novamente. Ele precisa aderir ao
regime como forma de evitar uma confusão patrimonial.
Participação Final
nos Aquestos (Código Civil, art. 1.672)
É o regime menos
utilizado pelos casais - e o mais complexo.
Por ele, os bens que
pertenciam aos cônjuges antes do casamento não são partilhados, apenas os que
foram adquiridos durante o matrimônio. Até aí, ele se parece com a comunhão
parcial de bens, mas há diferenças, como aponta a advogada:
“Durante o casamento,
cada um tem autonomia para administrar seus bens, sem a interferência do
parceiro e, principalmente, independente da vontade ou valorização do outro”.
Quanto às regras de
sucessão, o cônjuge sobrevivente tem direito a metade dos bens comuns do casal
e é herdeiro dos bens particulares do falecido.
Pode alterar?
A resposta é sim. “A
alteração de regime de bens é possível e possui procedimento próprio previsto
no Código de Processo Civil. Mas antes, é necessário autorização judicial. Por
meio de um advogado, o casal deve formular o pedido e apresentar uma
justificativa”, informa a especialista da advocacia Romano, Raunaimer e Frank,
Anatércia Romano.
A importância do
planejamento matrimonial
O casal deve fazer o
Pacto Antenupcial no cartório de registro de notas. Ele é uma espécie de
contrato feito pelos noivos para estabelecer o regime de bens e tratar as
questões patrimoniais. Para se tornar válido, o pacto precisa da lavratura de
escritura pública no Cartório de Notas e ser enviado ao Serviço Registral de
Pessoas Naturais.
Segundo a advogada, o
ideal é que os cônjuges, antes de casar ou constituir União Estável, levem em
consideração o patrimônio já adquirido por cada um, filhos existentes de outros
relacionamentos, potencial econômico e atividade profissional de cada um,
dentre outras situações.
“E, principalmente,
qual a expectativa e desejo do casal com relação ao patrimônio que cada um já
tem e o que poderão adquirir durante a união”, diz.
Dependendo do caso, é
necessária a realização de um Planejamento Matrimonial, por meio de um advogado
familiarista, onde o casal pode escolher um regime de bens misto, de acordo com
sua vontade.
O Planejamento
Matrimonial pode incluir muitas coisas, inclusive animais de estimação. Essa é
uma questão recorrente, que já chegou até no STJ (Superior Tribunal de
Justiça): Quando o casal que adotou um pet se separa, quem fica com a guarda?
“O entendimento da
Corte Superior é que, ainda que os animais não se enquadrem nas previsões
legais referentes à guarda, eles não podem ser tratados como coisas,
principalmente pelo elo emocional estabelecido com o núcleo familiar”, explica
Anatércia.
Por este motivo, em
casos de divórcio ou dissolução da união estável, casais que estão disputando a
guarda do animal na Justiça recebem como solução a guarda compartilhada do
animal, com direito a visita e até mesmo pensão alimentícia.
Pessoas em união
estável, segundo a advogada, têm os mesmos direitos de pessoas em um casamento.
Portanto, caso não optem por um regime diverso, é aplicada a comunhão parcial
de bens.
Cuidado
Infelizmente, nem
todo mundo casa por amor. Um dos crimes mais comuns é o de fraude patrimonial
no casamento, no qual o cônjuge frauda a divisão conjugal.
Anatércia conta que
são várias as falcatruas conjugais que têm como objetivo reduzir a parte do
cônjuge. As mais comuns são três: ocultação de bens, disfarce de bens e
simulação de obrigações.
Na ocultação, o bem
desaparece do acervo comum do casal. No disfarce, uma terceira pessoa física ou
jurídica (denominada laranja) torna-se proprietária de bens que pertencem ao
acervo do casal. Na simulação de obrigações, dívidas, gastos e despesas são
hipoteticamente realizados.
Caso seja detectada
ou haja suspeita de fraude, Anatércia explica que é necessária a contratação de
um advogado familiarista para garantir a tomada de medidas urgentes. Entre
elas, proteger o patrimônio e também devolvê-lo à pessoa lesada, ou dar a
devida compensação.
Fonte: G1 – Santos e região