Diante do número significativo de imóveis
irregulares ou que não refletem a realidade fática no fólio real dos registros
imobiliários do país, é crescente a necessidade de institutos que possibilitem
ao proprietário meios de resguardar o seu direito, conferindo segurança
jurídica às relações imobiliárias.
Aliada à problemática citada, verifica-se,
também, que a busca por instrumentos que promovam a desjudicialização e
extrajudicialização, retirando do Judiciário a alta carga de demandas, é medida
que se impõe, a fim de evitar o colapso do sistema, bem como que litígios que
realmente necessitem da atuação jurisdicional fiquem sem soluções rápidas e
satisfatórias.
Nesse contexto, o extrajudicial se destaca
como meio eficiente para atingir os objetivos propostos. A capilaridade das
serventias extrajudiciais, presentes na maioria dos municípios brasileiros,
permite que o notário e o registrador estejam em contato direto com as demandas
locais, resolvendo as questões relativas à propriedade imobiliária com grande
conhecimento técnico e maior celeridade.
É possível notar este movimento com a
regulamentação do inventário extrajudicial, inclusive quando há presença de
menores ou incapazes, usucapião, adjudicação compulsória e resolução contratual
quando comprovado o inadimplemento por meio de ata notarial, por exemplo.
Além disso, o CNJ, por meio da portaria
4/25, dispôs sobre as regras, procedimentos e critérios para a participação no
Prêmio Solo Seguro, cujo objetivo descrito no art. 2º, é:
I - Reconhecer e disseminar boas práticas
de regularização fundiária urbana e rural no país;
II - Premiar e disseminar ações, projetos
ou programas inovadores e práticas de sucesso que visem ao aperfeiçoamento da
Regularização Fundiária Urbana - Reurb e rural, bem como à identificação de
áreas públicas e de proteção ambiental, à simplificação de procedimentos, à
gestão compartilhada de informações e à redução da quantidade de tempo e de
recursos necessários à conclusão de processos de regularização fundiária;
III - Estimular a inovação e a replicação
de iniciativas voltadas para a segurança jurídica e proteção ambiental.
IV - Incentivar a articulação entre órgãos
públicos, privados e a sociedade civil para a promoção da governança fundiária
responsável.
Neste sentido, um valioso instrumento de
regularização imobiliária e que pode ser incentivado na via administrativa,
através de uma normatização nacional, é o instituto da estremação, cuja
previsão legal está no CPC, art. 571, por meio do qual permite-se a demarcação
e a divisão imobiliária de imóveis por escritura pública, desde que os
interessados sejam pessoas maiores, capazes e concordes.
É importante distinguir o instituto da
estremação do da divisão, visto que com a estremação não é necessária a
participação de todos os condôminos de uma propriedade, mas apenas dos
respectivos confrontantes do imóvel a ser estremado. Desta forma, aquele que
não possui os recursos econômicos não impede que quem o possua, possa resolver
sua situação.
A segurança jurídica que se extrai do
instituto vem da regulamentação sobre as exigências que são pertinentes
conforme se esteja estremando imóvel urbano ou rural, e que serão devidamente
resguardadas pela atuação do Tabelião de Notas e do registrador de imóveis
agindo cada qual no cumprimento de sua função nos momentos e atos respectivos.
A estremação tem aplicação prática para os
condomínios pro diviso, pois permite a mudança da matrícula ou transcrição em
que caracterizado o condomínio geral para a matrícula própria de uma
regularização da área que, faticamente, já se encontra perfeitamente demarcada,
sem conflito de interesses e sem a necessidade de participação de todos os
condôminos como seria.
O Tabelião de Notas é o profissional que
zela pela segurança jurídica do procedimento de estremação feito na via
administrativa em conjunto com o registrador de imóveis, observando o
cumprimento da especialidade objetiva na descrição do imóvel estremado,
identificado como corpo certo que já é de fato para alcance da matrícula
própria e com isso, a conformidade com o princípio da continuidade e controle
da disponibilidade.
Tais mecanismos garantem o respeito também
à CF/88, que trouxe forte respaldo constitucional para a questão da
regularização imobiliária, especialmente para priorizar e exigir cumprimento no
que tange à função social da propriedade.
Não obstante, tem-se que, atualmente, este
instituto só é regulamentado em alguns Estados, como Pernambuco, Paraná, Mato
Grosso, Tocantins, Bahia, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, sendo este último,
o pioneiro no assunto. Por outro lado, outros estados carecem de previsão
normativa, deixando casos reais que poderiam ser solucionados na via
administrativa, dependerem de decisões judiciais que, por vezes, são
morosas.
Nesse contexto, destaca-se a importância
da atuação das Corregedorias Estaduais que, em conjunto com as serventias
extrajudiciais, atuam na regulamentação do procedimento e promovem não só a
observância do princípio da segurança jurídica e da verdade real nos registros
públicos, como também o desenvolvimento de todo o sistema imobiliário, com o
acesso dos imóveis regularizados ao mercado formal.
Ora, o coproprietário que possui a
demarcação fática de seu imóvel dentro da área maior do condomínio geral é um
proprietário que entrega a função social de sua propriedade, pois presume-se
nela presente. Caso contrário, não existiria a realidade fática de posse e
utilização da fração no solo bem delineada e destacada para ensejar o
procedimento de estremação.
Há um protagonismo da função social da
propriedade quando se fala em Direito Imobiliário e da atuação cada vez mais
forte e presente do Tabelião de Notas na regularização de imóveis pela via
administrativa, que é célere, efetiva e economicamente vantajosa ante a
segurança jurídica que proporciona.
As vantagens da desjudicialização da
estremação são precisas e atendem aos requisitos das dimensões jurídica,
registral e urbanística que o instituto exige. Por isso se faz urgente a
regulamentação normativa deste procedimento no Estado de São Paulo tal como
realizado no inventário e partilha, no divórcio, na usucapião e na adjudicação
compulsória, por exemplo.
Com a possibilidade de instrumentalização
do procedimento de estremação na via administrativa possibilita-se um grande
fomento econômico quanto aos imóveis do Estado, pois a circulação de riquezas
imobiliárias pressupõe a existência da matrícula que individualiza e identifica
cada imóvel, em sua especialidade objetiva, respeitando os princípios da
continuidade e disponibilidade, com a correta identificação do proprietário de
cada imóvel estremado (especialidade subjetiva), além da segurança na transparência
e publicidade que a matrícula própria do imóvel estremado irá gerar.
Para o proprietário que alcança a
estremação de seu imóvel, permite-se investimentos seguros, garantias
imobiliárias, benefícios fiscais, obtenção de créditos, regularização de
construções, cadastros municipais, dentre outros.
Motivo pelo qual, a padronização do
procedimento de estremação administrativa, com a respectiva permissão no Estado
de São Paulo, é essencial para fomentar a economia, garantindo segurança e
transparência no mercado imobiliário e beneficiando tanto proprietários quanto
a sociedade como um todo.
Fonte: Migalhas