Caso
o falecido não tenha compartilhado senhas com os herdeiros, a busca por
informações patrimoniais e bens digitais em seus aparelhos eletrônicos poderá
ser feita por meio de um incidente processual a ser instaurado paralelamente ao
processo de inventário, com o apoio de profissional especializado – o
inventariante digital.
A
decisão foi tomada pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no
julgamento de recurso relacionado ao inventário das vítimas de um acidente de
helicóptero ocorrido em São Paulo, em 2016.
Como
não há previsão legal sobre o acesso aos bens digitais deixados por uma pessoa
falecida, o colegiado entendeu que o caminho mais adequado para tais situações,
pelo menos até a aprovação de legislação específica, é a instauração de um
incidente próprio, associado à aba do inventário – chamado pela relatora do
caso, ministra Nancy Andrighi, de "incidente de identificação,
classificação e avaliação de bens digitais".
Acesso
ao conteúdo dos aparelhos será feito por profissional especializado
De
acordo com a solução proposta, o incidente, apensado ao processo (associado à
aba) de inventário, deverá ser conduzido pelo próprio juiz do inventário, e o
acesso aos aparelhos eletrônicos será feito por intermédio de um profissional
especializado, que identificará e classificará os ativos transmissíveis,
preservando tudo o que possa violar os direitos de personalidade do autor da
herança.
O
caso chegou ao STJ depois que uma das inventariantes tentou conseguir acesso ao
conteúdo dos aparelhos mediante ofício à Apple. No entanto, de acordo com a
ministra Nancy Andrighi, autorizar a empresa a abrir um equipamento eletrônico
de pessoa falecida poderia violar sua intimidade.
Solução
está amparada em analogia com outros institutos jurídicos
A
relatora afirmou que o direito sucessório deve assegurar que a impossibilidade
de acesso aos bens digitais, devido à existência de senhas não compartilhadas
com os herdeiros, não cause prejuízo à transmissão do patrimônio. Contudo, ela
apontou que nem todos os bens digitais são transmissíveis: aqueles que possam
violar direitos de personalidade, como a intimidade e a vida privada do
falecido ou de terceiros, devem ser preservados.
Assim
– prosseguiu a ministra –, o juiz deve equilibrar o direito dos herdeiros a
receber todos os bens do falecido, em consonância com o artigo
5º, inciso XXX, da Constituição Federal, com a proteção dos
direitos de personalidade, especialmente a intimidade do falecido e de
terceiros.
"Diante
de vácuo legislativo a respeito do acesso aos bens digitais de propriedade da
pessoa falecida que não deixa senha nem administrador dos seus bens digitais, a
proposta de que o acesso se dê mediante incidente processual não caracteriza
ativismo judicial e está alicerçada em interpretação analógica com outros
institutos processuais", declarou Nancy Andrighi, ao determinar o retorno
do processo ao primeiro grau para a instauração do mencionado incidente.
Leia
o acórdão no REsp 2.124.424.
Fonte:
STJ