Os efeitos da pandemia causada pela covid-19 ainda são
inimagináveis. Se a princípio a preocupação era voltada quase que
exclusivamente a questões referentes à saúde, hoje já sabemos que a crise tem
reflexos sociais, econômicos, culturais e políticos. Planos, projetos e
orçamentos tiveram que ser repensados. Esse é o caso, por exemplo, da Lei Geral
de Proteção de Dados (LGPD), prevista para entrar em vigor em agosto de 2020.
Os prazos da LGPD estão sendo renegociados. O Projeto de Lei
(PL) 1179/20, do senador Antonio Anastasia, complementado pelo relatório da
senadora Simone Tebet, propõe, entre outros pontos, que a lei entre em vigor em
janeiro de 2021 e que suas sanções sejam aplicadas após seis meses. Diante
desse cenário epidêmico generalizado, e, considerando a complexidade da lei, os
custos envolvidos e a ausência de diretrizes para a adequação, o mais provável
é que haja essa prorrogação.
Até porque, caso a LGPD entre em vigor em agosto de 2020,
como o previsto, muito provavelmente, organizações dos setores privado e público
teriam que acelerar seus respectivos procedimentos para estar de acordo/em compliance
com a lei.
Quanto ao mercado, estima-se que a entrada em vigor da lei
implicará ainda mais na necessidade de vultosos investimentos em seguros,
procedimentos, treinamentos, contratações, dentre outras adaptações nas
estruturas empresariais. Esse valor pode variar conforme o porte, nível de
maturidade com relação à proteção de dados e área de atuação da companhia.
Já para o governo, o principal entrave seria a constituição
da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, responsável por fiscalizar o
cumprimento da lei e, se preciso for, aplicar as sanções e multas devidas aos
que descumpri-la. Afinal, não faz sentido ter uma lei em vigor sem um órgão
fiscalizador e ainda: uma lei em vigor, sem qualquer sanção. Contexto esse que
causa ainda mais insegurança jurídica.
Vale ressaltar que, se adequar à Lei Geral de Proteção de
Dados, não deve ser encarado como uma maratona. É muito mais do que isso.
Trata-se de disseminar uma nova cultura, de privacy and data protection, em
todos os níveis hierárquicos e posições. E essa, é a melhor parte. Nesse
processo, os protagonistas serão a privacidade, ética, transparência e
segurança. Não respeitar a lei, pode trazer grandes prejuízos – financeiros e
reputacionais -, às organizações.
Por outro lado, aqueles que já estiverem de acordo com a
LGDP terão um diferencial competitivo. A lei é uma combinação de proteção de
dados, segurança, com o dinamismo econômico trazido pela tecnologia e inovação.
Acarretando assim, benefícios inúmeros a qualquer empresa, especialmente frente
aos seus stakeholders, parceiros, fornecedores, clientes, colaboradores e
titulares de dados.
A LGPD é principiológica, ainda que baseada e inspirada nos
moldes europeus do General Data Protection Regulation / Regulamento Geral sobre
a Proteção de Dados (GDPR). A lei brasileira não traz consigo normas claras,
definidas e resolutivas. A exemplo, não se vislumbra diretrizes para a
adequação.
Independentemente da posição final acerca da prorrogação, a
implementação dos preceitos e da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados é
de fundamental importância, para a maior concretização dos direitos
fundamentais e da inovação. No momento, os dados são considerados os principais
ativos, das pessoas físicas e jurídicas. Milhões e milhões de dados pessoais
são compartilhados a cada segundo e a lei surge para regulamentar o tratamento.
Os impactos da medida serão profundos, mas a sua chegada, seja em 2020 ou 2021,
deve ser vista com bastante otimismo, especialmente aos que desejam um mercado
mais confiável e promissor.
Fonte: Estadão