Uma das principais demandas que têm chegado ao Tribunal
de Justiça de São Paulo durante a quarentena implantada no estado para combater
o coronavírus é a redução do aluguel de estabelecimentos comerciais que
tiveram que fechar as portas. Essa é uma questão que não está
pacificada na Corte e tem dividido os desembargadores.
De um lado, há magistrados que entendem que a crise
econômica derivada da epidemia da Covid-19 justifica a redução do valor pago
pelos empresários. Do outro, desembargadores defendem a necessidade do
contraditório ou dizem que a diminuição do aluguel pode gerar desequilíbrio
contratual, uma vez que a crise não atinge apenas o locatário, mas também o
locador.
A ConJur fez um levantamento de decisões
monocráticas proferidas pelo TJ-SP nos últimos dias sobre redução de aluguel
durante a quarentena.
O desconto vale enquanto o shopping permanecer fechado.
Segundo a desembargadora, não se pode ignorar o fato de que a quarentena
instituída pelo Estado de São Paulo terá "impacto significativo no
faturamento da agravante, que continuará arcando com uma série de encargos e
despesas fixas durante todo esse período".
Em decisão semelhante, o desembargador Tercio Pires,
da 34ª Câmara de Direito Privado, aplicou a teoria de imprevisão para
conceder desconto de 50% a uma loja de jogos eletrônicos localizada em um
shopping. Pires citou que, no âmbito das relações privadas, a "Lei
substantivo Civil trouxe disciplinada a possibilidade de revisão contratual
lastreada em fato superveniente imprevisível desencadeador de onerosidade excessiva".
Segundo ele, a epidemia da Covid-19 também se enquadra
nos conceitos de caso fortuito e força maior, "em hipótese tais,
ainda que em havendo cumprimento diferenciado da obrigação por uma das partes,
não responde ela por eventuais prejuízos infligidos à outra". A redução do
aluguel foi autorizada durante o período em que a loja estiver fechada.
Já o desembargador Ruy Coppola, da 32ª Câmara de Direito
Privado, concedeu liminar a uma microempresa de confecção de peças de roupa
para manter o desconto de 60% do aluguel (concedido pela locadora)
até o final do período de proibição de funcionamento do comércio, mesmo após o
prazo do vencimento do aluguel (previsto para o dia 10 de cada mês).
Segundo Coppola, a situação atual de crise de saúde e econômica
permite que o desconto concedido pela locadora seja estendido, mesmo após o dia
do vencimento. "Ademais, ressalto que os encargos moratórios ficam
evidentemente suspensos, eis que já foi concedido o desconto de 60% do aluguel,
não sendo possível a decretação de despejo com base nos alugueis vencidos
durante o período de fechamento do comércio", disse.
Pedidos negados
O desembargador Jayme de Oliveira, da 29ª Câmara de
Direito Privado, negou a redução de 70% no aluguel pago por um posto de
combustíveis por entender que é imperioso ouvir os argumentos da parte adversa
antes de tomar qualquer medida unilateral. A decisão fica mantida até o
julgamento do caso pelo colegiado.
"Em sede de cognição sumária, embora sejam relevantes
as alegações do agravante, não há como se deferir, neste momento processual, a
tutela recursal da forma pretendida, sem a formação da triangulação processual,
como anotou o juízo de primeiro grau, em decisão criteriosa e
fundamentada", disse o desembargador.
Em decisão que vai na mesma linha, o desembargador
Kioitsi Chicuta, da 32ª Câmara de Direito Privado, negou liminar para
reajustar o aluguel de um restaurante de shopping em virtude
da necessidade do contraditório para uma melhor avaliação da
matéria, com destaque à função social do contrato e a incidência do
disposto no artigo 317 do Código Civil.
"Mesmo tendo a autora consideráveis argumentos, por
desenvolver atividade empresarial, com verossimilhança na alegação de
dificuldades na operação do sistema de entrega, obviamente com dificuldades em
relação às despesas mensais, em específico o aluguel que é de valor
considerável, não se verifica a urgência para a concessão da medidas sem oitiva
da parte contrária", afirmou.
Ao negar pedido de desconto no aluguel de uma loja, o desembargador
Costa Wagner, da 34ª Câmara de Direito Privado, afirmou que é
"inegável" que as relações jurídicas travadas entre particulares
igualmente sofrerão abalo em razão da epidemia do coronavírus.
Segundo o desembargador, "não podemos perder de mente,
porém, que existe uma grande cadeia produtiva formada pelos integrantes da
sociedade, de forma que o desarranjo de um setor pode comprometer o todo".
Ou seja, ao se conceder um benefício para uma ponta desta cadeia produtiva, se
a questão não for muito bem analisada e valorada, pode-se causar grande estrago
para a outra ponta.
"O cenário ideal será que as partes que firmaram
um contrato tenham maturidade, e acima de tudo, bom senso, para definir um
critério a lhes guiar durante esse período de excepcionalidade. Sem querer
tirar vantagens do momento, entendendo os problemas do outro e, acima de tudo,
reconhecendo que será esse auxílio mútuo em período tão difícil que irá
fortalecer relações comerciais cujos benefícios serão por todos auferidos no
futuro", afirmou.
Fonte: Consultor Jurídico