Um novo cenário foi instalado em nosso cotidiano. O novo
coronavírus ultrapassou as barreiras territoriais, assim como seus efeitos hoje
atingem todas as esferas da nossa sociedade, sem exceção. Infelizmente, a
capacidade de adimplir com os compromissos tem sido desafiada
constantemente e, por enquanto, não há prazo para acabar.
Como se não bastasse toda a enfermidade vivida pela saúde
pública, a paralisação da economia vem causando sérias dificuldades para
algumas empresas garantir o adimplemento. O cenário futuro se mostra
desesperador se levarmos em consideração uma pesquisa realizada pelo Banco
Central, a qual prevê uma redução do PIB brasileiro em 3,34% [1].
Nessas circunstâncias, os mecanismos legais de recuperação
de empresas ganham destaque frente às necessidades de reestruturação e
renegociação de dívidas. Da mesma sorte, a mediação deve servir de grande valia
para conduzir e retomar a negociação e o diálogo.
Sabe-se que, junto com a crise financeira e a onda de
inadimplemento, a insolvência de pequenos e grandes agentes econômicos se torna
corriqueira. A incapacidade de satisfazer os compromissos assumidos passa de
uma impontualidade extraordinária para representar uma regra perante os
credores. Os bens do devedor já não são mais suficientes para responder por
todas as dívidas contraídas, restando como única alternativa recorrer aos
procedimentos da Lei de Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência
nº 11.101/2005.
Frente a estagnação da economia, faz-se necessária a adoção
de mecanismos aptos a contingenciar danos a reduzir impactos. Assim como a
mediação atua no favorecimento da negociação entre as partes, a Lei de Recuperação
Judicial, Extrajudicial e Falência se apresenta como ferramenta essencial à
manutenção da atividade econômica e reestruturação daqueles em situação de
insolvência.
Os instrumentos previstos possibilitam às empresas em
pré-falência renegociar suas dívidas, no intuito de saldar seus débitos e ao
mesmo tempo manter a atividade econômica e os vínculos empregatícios. O
procedimento recuperacional tem como princípio e objetivo a manutenção da
empresa. O mencionado instituto encontra fundamento na Função Social da
Empresa, observando a preservação do emprego, o fomento econômico e a proteção
do crédito.
Em tempos de pandemia, ou ainda, pós-Covid-19, destaca-se a
possibilidade de adesão à recuperação extrajudicial, prevista
pelo artigo 161 e seguintes da Lei 11.101/2005. A alternativa ganha
relevância levando em conta sua celeridade e o baixo custo comparado à
provocação jurisdicional. Para fazer jus à recuperação, o empresário não pode
ter se beneficiado do instrumento nos últimos cinco anos e deve exercer
atividade regular há mais de dois anos, conforme exigências
do artigo 48 da Lei 11.101/2005.
A lei permite que o empresário em crise
econômico-financeira possa propor e negociar um plano de recuperação
diretamente com os credores. Nessa oportunidade, novos prazos e valores poderão
ser estabelecidos a fim de verificar viabilidade ao contínuo da atividade
empresarial.
O acordo firmado em sede de recuperação extrajudicial
representa uma novação das dívidas, sendo a homologação facultativa, nos termos
do artigo 162, IV, da Lei 11.101/2005. As tratativas poderão versar
sobre a parcialidade da dívida, no sentido de eleger apenas alguns credores
para negociação.
A recuperação extrajudicial proporciona um real
favorecimento dos interesses das partes, uma vez que diminui as interferências
externas ao dispensar o envolvimento do Ministério Público e a nomeação de
Administrador Judicial. Entretanto, não há exatamente um facilitador para
mediar o regime concorrencial, a fim de preservar a isonomia e a busca por uma
composição menos onerosa.
Em contrapartida, uma forma rápida e bastante eficaz para a
realização da recuperação extrajudicial é através da mediação, pois a oralidade
e informalidade da mediação conversam de forma excepcional com as demandas
negociais e interesses da recuperação extrajudicial, garantindo a sobrevivência
da cadeia econômica de uma forma isonômica entre todos os envolvidos, de uma
maneira informal e pautada pela confidencialidade. A modernização em técnicas e
equipamentos se contrapõe à tradicional morosidade do modelo de
judicialização combativa.
A mediação é um método de resolução consensual de conflitos
que visa à busca do consenso das partes de uma maneira amigável, atendendo
à necessidade e aos interesses de todos. Ela é conduzida pelo mediador, um
terceiro imparcial escolhido pelas partes com conhecimento no assunto e que tem
como objetivo facilitar a negociação, não interferindo e nem tomando quaisquer
decisões.
Introduzida pelo artigo 3° do Código de Processo
Civil, a mediação tem sua regulamentação através da Lei 13.140/2015, que dispõe
sobre os seus princípios e procedimentos. No âmbito da recuperação
extrajudicial, foi declarada a sua compatibilidade com a mediação, através da
aprovação do Enunciado 45 da Jornada Prevenção e Solução Extrajudicial de
Litígios, realizada em 2016.
O Conselho Nacional de Justiça também já se manifestou sobre
o tema editando a Recomendação Nº 58/2019, a qual estimula
a utilização de sessões de mediação em processos de recuperação judicial e
extrajudicial, "considerando que o objetivo da recuperação judicial
nos termos do artigo 47 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de
2005, é viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do
devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos
trabalhadores e dos interesses dos credores, preservando a empresa, sua função
social e o estímulo à atividade econômica".
Além de evitar uma judicialização, a mediação é mais rápida
e vem ao encontro da recuperação extrajudicial, uma vez que oportuniza ao
empresário devedor negociar diretamente com os seu credores, de uma forma em
que todos sejam ouvidos e tenham seus interesses atendidos, estabelecendo
critérios e formas de pagamento que possam sustentar tanto a sobrevida da empresa
devedora quanto de seus credores.
Em um momento de mudanças, repleto de incertezas e
questionamentos, o diálogo se mostra a maneira mais humana, eficaz e coerente
de resolver os problemas e evitar desgastes futuros.
Fonte: Consultor Jurídico