O Senado Federal aprovou nesta terça-feira (19/5) o Projeto de
Lei 1.179/20, que suspende normas do Direito Privado
durante a epidemia de Covid-19. O projeto segue agora a sanção
presidencial.
Originalmente, o PL previa que a Lei Geral de
Proteção de Dados Pessoais (LGPD — Lei 13.709/18) teria vigência a partir de janeiro de
2021, com multas e sanções administrativas válidas somente a partir de
agosto do mesmo ano.
Na Câmara, havia sido aprovado um substitutivo ao projeto, segundo o qual a
vigência da LGPD começaria em maio de 2021 — prazo também previsto pela MP 959, de 29/4/20.
Na noite desta terça, contudo, o Senado voltou a alterar a
data de vigência da LGPD: segundo a nova redação, começa a vigorar em agosto de
2020; os artigos que tratam das sanções só entrarão em vigor em agosto de
2021.A alteração foi feita por meio de um destaque do
senador Weverton (PDT-MA).
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), afirmou
que a LGPD é "principal legislação na prevenção e combate aos ataques
criminosos promovidos pelas fake news no país", o que
justificaria sua vigência já em agosto deste ano. Wewerton foi na mesma
linha: a mudança seria importante para o enfrentamento das notícias
falsas.
Para especialistas ouvidos pela ConJur, contudo, a data
de vigência da LGPD continua incerta. "A votação do Senado
trouxe mais incertezas. Caso o presidente da República vete a decisão no
âmbito do PL 1.179 e a MP 959 não seja convalidada, voltamos ao status
quo de 50 dias atrás. Difícil de acreditar", diz o
advogado Gustavo Artese, especialista em proteção de dados e sócio do
escritório Viseu Advogados.
Há uma disputa política entre o Planalto e o Senado acerca
da questão. Isso porque a MP tratava de outra matéria — a concessão de auxílio
emergencial durante o estado de calamidade pública —, mas um artigo isolado
versou sobre a LGPD — o que no jargão político é conhecido como
"jabuti". O Senado, que à época da edição da MP já vinha discutindo a
matéria, sentiu-se então confrontado.
"A Medida Provisória 959 vai caducar, porque foi feita
para auxiliar no auxilio emergencial e isso já está sendo feito. Já falei com
vários líderes e a Câmara vai deixar caducar. Portanto, se os senadores que querem
ajudar a combater fake news, algo importante, afinal estamos em ano
eleitoral, estamos em meio a uma pandemia, ela deve vigorar agora", disse
o senador Wewerton.
"Na prática, essa decisão de ontem do Senado faz com
que aumentem as chances de que o adiamento não vá ocorrer, mantendo-se
a vacatio legis para agosto deste ano (como previsto
originalmente)", explica Artese.
O advogado Lucas Paglia, sócio-fundador da P&B
Compliance, aponta que, apesar de fundamental, a Lei Geral de Proteção de
Dados não é o remédio adequado para combater fake news. "Em nenhum
lugar do mundo se conseguiu por meio de uma legislação desse tipo coibir a
disseminação de fake news. O ordenamento jurídico em torno dos dados dos
cidadãos brasileiros ficará mais robusto, mas isso não vai resolver o problema
das notícias falsas", explica.
Impacto nas empresas
Segundo Paglia, a entrada em vigor ainda este ano da LGPD
pode impactar negativamente nas empresas, que já convivem com a crise provocada
pelo avanço da Covid-19. "A adequação das empresas à LGPD tem custo
financeiro e operacional. É preciso dedicação interna, treinamentos,
entrevistas e alta direção comprometida. Em cenário que todos os esforços estão
voltados para sobrevivência das empresas por conta da pandemia, a situação se
complica", explica.
Nesse quadro de incerteza, sai na frente quem se adiantou e
já se adequou à normativa antes de sua entrada em vigor. "Países da
Comunidade Europeia, onde a GDPR já está vigente há dois anos, já vinham
exigindo das empresas brasileiras com quem mantêm relações comerciais a
transparência de que estavam se adequando à LGPD", comenta o
advogado Guilherme Guimarães, especialista em Direito Digital e Segurança
da Informação.
Pontos positivos
Se a antecipação da entrada em vigor da LGPD desagradou a
muitos, o adiamento da normativa também provocou discussão. Isso porque a iniciativa
de uso de dados pelo governo no combate à Covid-19 sem a lei em vigor está
longe de ser o ideal.
Em entrevista à ConJur em abril deste ano,
a advogada e presidente da Comissão de Proteção de Dados e privacidade da
OAB, Estela Aranha, pontuou que a solução ideal seria um meio termo.
"Apoiamos o adiamento das sanções. Hoje é o momento de preservarmos o
emprego, as empresas e a atividade econômica. O que defendemos é que sejam
adiadas apenas as sanções, mas os princípios e fundamentos da lei devem entrar
em vigor, até para dar um padrão para o poder público utilizar esses dados
durante a pandemia do novo coronavírus", afirmou.
Na votação que antecipou a entrada em vigor da LGPD, os
parlamentares mantiveram o adiamento das sanções previstas na nova normativa.
Fonte: Consultor Jurídico