Pais tentam reduzir valores pagos em razão de pandemia,
por meio de acordos ou pela via judicial
Pais afetados pela crise tentam por meio de negociação ou
mesmo pela Justiça suspender ou reduzir temporariamente valores de pensão
alimentícia - em alguns casos pela metade. A busca por um acordo, porém, nem
sempre é fácil e o Judiciário pode não ser receptivo. No Rio Grande do Sul, uma
juíza entendeu que, por ser “bem-sucedido profissionalmente e economicamente”,
o pai teria reservas financeiras suficientes para manter os pagamentos integrais
a uma filha.
Na outra ponta, vale tudo para manter uma renda mínima para
o sustento do filho, inclusive o bloqueio de parte do auxílio emergencial
oferecido pelo governo federal. Recentemente, o juiz Ronaldo Guaranha Merighi,
da 2ª Vara de Família e Sucessões de São José do Rio Preto (SP), determinou o
repasse de 40% dos R$ 600 recebidos mensalmente por um pai ao filho.
O valor, a ser pago durante pelo menos três meses, será
utilizado para amortizar dívida de aproximadamente R$ 4 mil. “O pai chegou a
ser preso e não conseguimos receber a dívida. Resolvemos então tentar o auxílio
emergencial”, diz o advogado Luis Otávio Moraes Monteiro, do escritório Moraes
Monteiro Advocacia, que defende o menor. “A tese foi levada a outros tipos de
execução. Porém, sem sucesso.”
Negociar, segundo especialistas, é agora o melhor caminho em
meio à pandemia de covid-19. Ainda mais sem a principal arma para pressionar os
pais inadimplentes: a ameaça de prisão. No fim de março, o ministro Paulo de
Tarso Sanseverino, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), determinou prisão
domiciliar para todos os devedores de alimentos do país.
A decisão foi dada em pedido apresentado pela Defensoria
Pública da União (HC 568021). De acordo com o órgão, a medida beneficiaria
quase duas mil pessoas com decretos de prisão civil decorrentes de dívida de
alimentos.
“O que resulta em pouca efetividade”, diz a advogada Renata
Santa Maria, sócia do escritório Mônica Guazzelli Advogadas. “Uma boa
alternativa, sobretudo em situações extremas, é buscar o diálogo. Mas quando
não é possível, a alternativa é solicitar a revisão do valor da pensão, mesmo
que temporariamente, pela via judicial”, acrescenta.
Nem sempre, porém, consegue-se na Justiça a redução
temporária dos valores, mesmo que se prove que a quarentena afetou
drasticamente o bolso. Um médico não obteve redução temporária do valor da
pensão paga a uma filha, por ser considerado pela juíza Luciana Beledeli, da
Vara de Família de São Leopoldo (RS), como “bem-sucedido profissionalmente e
economicamente”.
“Não há o que se falar na alegada probabilidade do direito
do requerido em ver redimensionada a pensão alimentícia destinada à autora, já
que eventual acolhimento do pedido implicaria em prejuízo para a alimentanda,
não sendo crível que a atual situação, de caráter excepcional e temporária,
possa causar prejuízo ao próprio sustento do demandado e de sua família, uma
vez considerado o estável padrão de vida exaustivamente demonstrado no feito”,
diz a juíza.
O médico, segundo a advogada Renata Santa Maria, que o
defende, trabalha com cirurgias plásticas, que foram canceladas por conta da
pandemia de covid-19. Já foi apresentado recurso à segunda instância.
“Entendemos que os problemas financeiros enfrentados pelo provedor terão
repercussão no padrão de vida dele e dos dependentes”, afirma.
Em Jacareí, no interior de São Paulo, porém, uma mãe
conseguiu reduzir o valor da pensão destinada à filha adolescente. Na decisão
da 2ª Vara de Família e Sucessões, foi fixado valor de 30% do salário mínimo
para os meses de março, abril, maio e junho. Após o período, a mãe deverá
destinar 20% de seus rendimentos líquidos.
Por meio de negociações, advogados tentam reduzir pela
metade os valores de pensões ou mesmo suspender os pagamentos. No escritório
Mônica Guazzelli Advogadas, onde a advogada Renata Santa Maria atua, há cinco
tentativas de acordos em andamento, todos com previsão de pagamento, ainda
neste ano, da diferença que deixará de ser paga agora.
Para o sucesso de um acordo ou processo judicial, afirma o
advogado Caio Simon Rosa, sócio do escritório NB Advogados, é preciso
demonstrar que a parte realmente não tem condições de arcar com os pagamentos
integrais. “É preciso provar a suspensão do contrato de trabalho ou redução de
salário ou de rendimentos, por meio de extratos bancários”, diz.
A pandemia, acrescenta o advogado, gerou ainda outro
problema. Por medo do contágio, pais com guarda compartilhada passaram a negar
a saída dos filhos de casa. No Paraná, uma mãe solicitou a suspensão das
visitas presenciais do pai, que poderiam passar a ser virtuais.
O pai, porém, conseguiu reverter decisão desfavorável no
Tribunal de Justiça (TJ-PR). Ele poderá revezar a convivência com a mãe por 15
dias consecutivos.
Fonte: Valor