O Brasil vive uma baixa em relação ao número de divórcios.
Índices apontam uma diminuição de 43% entre fevereiro e abril de 2020, quando
comparado com o mesmo período do ano passado. Os dados escondem que o
distanciamento social imposto pelo combate ao coronavírus afastou a população
do Poder Judiciário e impôs operação excepcional.
Os dados são da Central Notarial de Serviços Eletrônicos
Compartilhados (Censec) e mostram que, entre fevereiro e abril de 2020, o
Brasil registrou 10,7 mil divórcios, contra 18,8 mil no mesmo período, em
2019.
Há uma previsão de que, ao fim da quarentena, haja um
crescimento dessa demanda. "Como já estamos há mais de dois meses
vivenciando o isolamento, percebemos que os números aqui no Brasil poderão ser
bem altos!", aponta a advogada Ana Paula Protzner Morbeck, do
Instituto Brasileiro de Direito de Família.
"Percebemos que o 'processo' de divórcio ocorre
bem antes da judicialização, advindo de uma relação falida, mantida pelas
partes por motivos diversos — como filhos, acomodação da relação e até
mesmo pelo pouco contato do casal frente a um dia a dia corrido e cheio de
atividades fora de casa para ambos. Com a pandemia e o confinamento das
famílias, os conflitos se afloram, a diferença entre o casal fica estampada e a
convivência sob o mesmo teto pode se tornar insuportável", avalia.
Prazos interrompidos
O procedimento a ser adotado por alguém que se deseja
separar, no momento, depende do local em que a pessoa se encontra. Nem todos os
estados brasileiros possuem o processo judicial eletrônico, e o Conselho
Nacional de Justiça (CNJ) manteve a suspensão dos processos físicos até 31 de
maio.
"A apreciação será feita somente em caso de urgência em
razão de algum risco grave ou perigo de dano", explica Ana Paula.
A necessidade da apreciação do pedido de urgência deve ser
demonstrada com base nas regras do artigo 300 do Código de Processo Civil – CPC. O dispositivo prevê
que "a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que
evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado
útil do processo".
"Há diversas hipóteses em que a separação imediata do
casal se faz urgente e necessária, como quando há violência doméstica, quando o
conflito entre os genitores acaba por respingar nos filhos dentro de casa ou
até mesmo para rompimento da relação para fins patrimoniais e
sucessórios", atenta Ana Paula.
Destaca que, aqui ou no exterior, a assistência jurídica é
fundamental para enfrentamento de um processo de separação, inclusive diante da
possibilidade de evitar a judicialização, devido ao momento vivido.
"O primeiro passo para quem deseja se separar é
procurar um advogado especializado que, a partir de uma boa escuta, orientará
conforme o caso, sendo que, em condições normais, tentar uma composição
consensual é o melhor caminho, podendo valer-se de uma mediação,
inclusive", ressalta.
Divórcio sem citação do marido
Recentemente, uma mulher conseguiu o divórcio antes mesmo da
participação do ex-marido no processo. O juiz substituto da 1ª Vara de Família
e de Órfãos e Sucessões de Águas Claras, no Distrito Federal, atendeu pedido de
urgência feito pela autora, em decisão liminar, entendendo que o divórcio depende da vontade de
uma das partes, nada restando ao outro senão aceitar essa decisão.
O magistrado ordenou ainda a expedição de mandado para a
devida averbação em cartório, bem como a citação do homem para oferecer
resposta no prazo legal. Em sua decisão, ele explicou que, apesar de o CPC não
trazer previsão específica sobre divórcio liminar, é possível a decretação
antecipada do fim do casamento por tratar-se de "direito potestativo e
incondicional".
Presidente da Comissão de Magistrados de Família do IBDFAM
(Instituto Brasileiro de Direito de Família), o desembargador Jones Figueirêdo
Alves elogiou a sentença. "A decisão tem o seu principal mérito ao
demonstrar que litigiosidade dessa espécie já não se faria mais necessária como
demanda inevitável ou obrigatória em juízos de família, carecendo a nossa
legislação de otimização que desenvolva mecanismos não judicializados dos
direitos potestativos", disse
Experiência internacional
Recentemente, a Justiça de Manhattan, nos Estados Unidos,
negou um pedido emergencial de divórcio por conta da pandemia. O juiz
responsável não considerou uma questão essencial e a oficialização da separação
deve ficar para o final da quarentena, segundo informações divulgadas pelo site
norte-americano PageSix. O caso envolve disputa do ex-casal pelo
apartamento em que viviam.
"Há casos que não podem esperar e, pelo que foi
noticiado a respeito da negativa do pedido de divórcio em Manhattan, havia
necessidade de apreciação do pedido com urgência porque a mulher ficaria sem
moradia. Outras questões podem envolver o processo, como a parte ter outro
local para morar, por exemplo. Cada caso é um caso, repleto de detalhes que
fazem a diferença na análise concreta", comenta Ana Paula.
Em Xiam, capital da província de Xianxim, na China, houve um
recorde no número de pedidos de divórcio, segundo o jornal local The
Global Times. A quarentena foi apontada pela imprensa como catalisadora das
separações. O pico foi atingido em março, quando as medidas de distanciamento
social começavam a ser relaxadas na localidade.
Fonte: Consultor Jurídico