Os valores de empréstimo consignado em folha de pagamento,
depositados na conta bancária do devedor, só recebem a proteção de
impenhorabilidade atribuída a salários, proventos e pensões, nos termos do
artigo 833, inciso ?IV, do Código de Processo Civil, quando forem
comprovadamente destinados à manutenção da pessoa ou de sua família. Fora dessa
situação, o crédito consignado pode ser normalmente penhorado por ordem do
juiz.
O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) ao determinar que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal
e dos Territórios (TJDFT) analise se os valores decorrentes de um empréstimo
com desconto em folha de pagamento são necessários à subsistência do devedor e
de sua família ou se poderiam ter sido efetivamente penhorados no processo.
O recurso teve origem em execução de título extrajudicial em
que o juiz determinou a penhora de quantia depositada em conta bancária também
destinada ao recebimento de salário. Segundo o magistrado, como o saldo
decorreu de empréstimo, não haveria impedimento ao bloqueio judicial dos
valores. Com fundamentos semelhantes, a decisão foi mantida pelo TJDFT.
Alteração de paradigma
O relator do recurso especial do devedor, ministro Villas
Bôas Cueva, lembrou que o STJ firmou jurisprudência no sentido de que o
salário, o soldo ou a remuneração são impenhoráveis, exceto quando se tratar
unicamente de constrição para pagamento de pensão alimentícia.
Entretanto, em 2018, o relator afirmou que a Corte Especial,
confirmando alteração de paradigma no âmbito do tribunal, fixou que a
impenhorabilidade só se aplica à parte do patrimônio do devedor que seja
realmente necessária à manutenção de seu mínimo existencial, razão pela qual
permitiu a penhora de parte do salário para o pagamento de dívida não
alimentar.
Comprometimento de renda
Em relação ao empréstimo consignado, Villas Bôas Cueva
apontou que não há norma legal que expressamente atribua à verba a proteção da
impenhorabilidade. Entretanto, o ministro explicou que essa modalidade de
crédito compromete a renda do trabalhador, do pensionista ou do aposentado,
podendo reduzir seu poder aquisitivo e, em certos casos, afetar a sua
subsistência. Por isso, em sua jurisprudência, o STJ confirmou a legalidade da
limitação dos descontos efetuados em folha de pagamento.
"Porém, ainda que as parcelas do empréstimo contratado
sejam descontadas diretamente da folha de pagamento do mutuário, a origem desse
valor não é salarial, pois não se trata de valores decorrentes de prestação de
serviço, motivo pelo qual não possui, em regra, natureza alimentar", disse
o relator ao ponderar que conclusão em sentido contrário provocaria ampliação
indevida do rol taxativo previsto no artigo 833 do CPC/2015.
Bases distintas
Ainda no tocante ao crédito consignado, o ministro explicou
que o salário e o empréstimo com desconto em folha possuem bases jurídicas
distintas: enquanto o salário tem origem no contrato de trabalho ou na
prestação do serviço, o empréstimo se origina de contrato de mútuo celebrado
entre o trabalhador e a instituição financeira ou cooperativa de crédito.
Por isso, o relator afirmou que, como regra, os valores
decorrentes de empréstimo consignado não são protegidos pela impenhorabilidade.
"Todavia, se o mutuário (devedor) comprovar que os
recursos oriundos do empréstimo consignado são necessários à sua manutenção e à
da sua família, tais valores recebem o manto da impenhorabilidade",
esclareceu, ressaltando que tal interpretação decorre da expressão
"destinadas ao sustento do devedor e de sua família", constante do
inciso IV do artigo 833 do CPC/2015.
Ao dar parcial provimento ao recurso especial, Villas Bôas
Cueva concluiu que o TJDFT não analisou a necessidade do valor discutido para a
manutenção do devedor e de sua família, pois entendeu apenas que era possível a
penhora do dinheiro de empréstimo depositado em conta bancária. Assim, a turma
determinou o retorno dos autos ao tribunal de origem para nova análise.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1820477
Fonte: Superior Tribunal de Justiça