A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
entendeu que é possível a coexistência da habilitação de crédito no processo
falimentar com a execução fiscal sem garantia, desde que a Fazenda Pública se
abstenha de requerer a constrição de bens em relação ao executado que também
figure no polo passivo da ação falimentar.
Com esse entendimento, o colegiado deu parcial provimento a
recurso da Fazenda Nacional contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo
que negou o pedido do fisco para habilitação de crédito na falência de uma
empresa, pois estava pendente execução fiscal em relação à mesma sociedade.
O TJSP concluiu que a escolha de um rito – pagamento do
crédito pela execução fiscal ou mediante habilitação de crédito – implicaria a
renúncia à utilização do outro.
Garantia
A autora do voto que prevaleceu no julgamento, ministra
Regina Helena Costa, explicou que a Fazenda Pública conta com ação específica
para a cobrança de seus créditos – a execução fiscal, disciplinada pela Lei
6.830/1980 (Lei de Execução Fiscal – LEF) e pelas disposições do
Código de Processo Civil, aplicado de forma complementar.
A ministra citou precedentes do tribunal sobre a utilização
simultânea, pelo fisco, da execução e da habilitação no processo falimentar
para a cobrança de crédito fiscal. Ao mencionar o REsp 185.838, ela destacou
que, uma vez "efetuada a penhora na execução fiscal, não há cogitar de
reserva de numerário no juízo da concordata, o que se constituiria, sem dúvida,
em garantia dúplice".
Regina Helena lembrou que a garantia é entendida como a
constrição de bens e direitos, sendo feita, na execução fiscal, por meio de
penhora ou indisponibilidade. No entanto, afirmou que "a tramitação da
ação executiva fiscal não representa, por si só, uma garantia para o
credor".
Autonomia
De acordo com a ministra, o juízo de conveniência e
oportunidade da Fazenda Pública se dá quando há a concomitância das vias da
execução fiscal e da falência, pois, sem a decretação da falência, não haveria
alternativa à execução.
Para ela, impedir a coexistência da ação executiva fiscal e
da habilitação de crédito no juízo falimentar vai contra os artigos 187 do Código Tributário Nacional, 5º e 29 da
LEF, bem como os artigos 6º e 7º da Lei 11.101/2005.
"Tal arcabouço legislativo garante a autonomia do sistema da LEF em
relação ao juízo universal falimentar, sem, contudo, comprometer, por si só, o
princípio da preservação da empresa", destacou.
Segundo a ministra, entendimento diverso reduz o campo de
atuação da Fazenda Pública no âmbito do processo falimentar, bem como a
possibilidade de o ente público exercer a fiscalização dos trâmites no juízo da
falência, por exemplo, quanto à ordem de classificação dos pagamentos a serem
efetuados aos credores com direito de preferência.
"Não há se falar, portanto, em renúncia à ação
executiva fiscal diante de pedido de habilitação de crédito no juízo concursal,
quando o feito executivo carece de constrição de bens", afirmou.
Caso concreto
Regina Helena Costa observou que, no caso em análise, a
Fazenda Nacional expressamente afirmou que não formulará pedido de penhora no
processo falimentar, sobrestando os pleitos no âmbito da execução até a
conclusão do primeiro. Dessa forma, a ministra afastou o impedimento verificado
pelo TJSP em relação ao pedido de habilitação, pois a execução fiscal não goza
de garantia, tendo sido proposta em 2013, antes da decretação da falência em
2014.
"Revela-se cabível a coexistência da habilitação de
crédito em sede de juízo falimentar com a execução fiscal desprovida de
garantia, desde que a Fazenda Nacional se abstenha de requerer a constrição de
bens em relação ao executado que também figure no polo passivo da ação
falimentar", concluiu.
Leia o acórdão.
Fonte: Supremo Tribunal de Justiça