Com duas novas recomendações para os tribunais brasileiros,
o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pretende mudar o desfecho de milhares de
processos de recuperação judicial e falências, o que muitas vezes significa
demissões e fechamento de empresas. Uma delas propõe a conciliação e mediação
entre empresários, fornecedores e trabalhadores como solução para evitar o
prolongamento indefinido das dívidas e da tramitação do impasse nas cortes. A
segunda norma padroniza a atuação dos administradores judiciais de empresas em
dificuldades. Ambas preparam os tribunais para o aumento do número de ações
judiciais envolvendo empresas atingidas pelas consequências econômicas da
pandemia da Covid-19.
As recomendações aprovadas por unanimidade na 69ª sessão do
Plenário Virtual, encerrada na última sexta-feira (17/7), se inspiram em boas
práticas já desenvolvidas em tribunais da Justiça estadual. Os textos dos atos
normativos foram elaborados por um grupo de trabalho nomeado pelo presidente do
CNJ e do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, em dezembro de 2018,
para modernizar a forma como o Judiciário lidava com as recuperações judiciais
e falências. Em um ano e meio de atuação, o grupo de trabalho coordenado pelo
ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Luis Felipe Salomão,
já encaminhou seis propostas que foram transformadas em recomendações do CNJ.
Integrante do grupo de trabalho e relator das recomendações,
o conselheiro Henrique Ávila afirmou que a conciliação e a mediação podem
auxiliar a sociedade brasileira a enfrentar a perspectiva de insolvência e
inadimplência no mercado. “A calamitosa situação em que a economia mundial se
encontra, diretamente decorrente dos impactos causados pela pandemia da
Covid-19, alertou o grupo a respeito de provável aumento da utilização do
Judiciário para demandar empresas que, por conta da crise, perdem as condições
de honrar com os compromissos anteriormente assumidos. O cenário ainda é de incerteza,
tendo em vista que não há como estimar, de modo minimamente preciso, até quando
persistirão os momentos de dificuldade.”
Crise econômica
De acordo com a “Pesquisa Pulso Empresa: Impacto da Covid-19
nas Empresas”, iniciada em junho pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), 522 mil empresas fecharam desde o início da pandemia, como
consequência da disseminação generalizada do novo coronavírus. Das firmas que
se mantiveram abertas, 70% relataram queda nas vendas, 34% demitiram pessoal e,
entre as que reduziram seus quadros, 29,7% delas cortaram mais da metade da sua
força de trabalho.
O que o CNJ propõe a tribunais é inspirado no Centro
Judiciário de Solução de Conflitos (Cejusc), inovação administrativa que dotou
os tribunais brasileiros de um setor específico para tentar solucionar
conflitos pela via do acordo entre as partes. Desde a edição da Resolução CNJ n.125/2010 que
nacionalizou a política de conciliação e mediação, o número dessas unidades
cresce no país. O Cejusc Empresarial, como foi chamado no texto aprovado pelos
conselheiros do CNJ na última sexta-feira (17/7), segue um modelo já praticado
com sucesso pelos tribunais de Justiça dos estados de São Paulo, Paraná, Rio de
Janeiro, Espírito Santo e Rio Grande do Sul, entre outros.
Concebido com apoio de especialistas e de membros do Fórum
Nacional de Juízes de Competência Empresarial (Fonajem), o texto do Ato
Normativo nº 0005479-03.2020.2.00.0000 aponta a necessidade de capacitação
especializada para os mediadores e conciliadores que atuarão nessa área, além
de sugerir formas para financiar essa formação de pessoal.
Administração judicial
A padronização dos relatórios que devem ser apresentados
pelos administradores judiciais em processos de falência e de recuperação de
empresas é o objetivo do texto aprovado no Ato Normativo nº
0005478-18.2020.2.00.0000. De acordo com a recomendação, os magistrados
responsáveis pela condução de processos de falência e recuperação judicial
devem orientar os administradores judiciais a apresentar relatórios periódicos
aos magistrados, para auxiliá-los na tarefa de conduzir o andamento dos
processos.
“Tais medidas são entendidas como boas práticas, na medida
em que permitem aos juízes um controle mais adequado dos processos, aumentando
a transparência e a eficiência dos processos de insolvência empresarial.
Ademais, a colheita dos dados estatísticos será valiosa para a orientação de
políticas públicas na área do direito empresarial”, afirmou o juiz auxiliar da
Corregedoria Nacional de Justiça Daniel Carnio Costa. De acordo com o
magistrado, a recomendação especifica a lei que trata da matéria e detalha o
conteúdo que deve constar em cada um dos relatórios, com modelos padronizados
para facilitar a compreensão aos interessados.
A lista de documentos inclui Relatório da Fase
Administrativa, Relatório Mensal de Atividades (RMA), Relatório de Andamentos
Processuais, Relatório de Incidentes Processuais e um questionário para fins
estatísticos. Costa, que é titular da 1ª Vara de Falências e Recuperações
Judiciais de São Paulo, já atuou em processos de recuperação judicial de grande
porte, como o de uma empresa envolvida na Operação Lava-Jato. “Existem
processos muito grandes e complexos, com muitas petições. Nesses casos, é
preciso que o administrador judicial apresente relatórios semanais ou, em
alguns casos, quinzenais.”
Fonte: Conselho Nacional de Justiça