Segundo o artigo 1832 do Código Civil, o cônjuge, ou
companheiro (Informativo nº 864 da Corte), quando concorre com os descendentes
para o recebimento da herança, terá o direito de receber um quinhão igual ao
dos que sucederem por cabeça. No entanto, nos casos em que o
cônjuge/companheiro for ascendente dos demais herdeiros, é feita a reserva da
quarta parte da herança.
Isso significa que quando o cônjuge/companheiro sobrevivente
for pai/mãe dos demais descendentes, a ele é reservado um patrimônio mínimo
correspondente a 25% do patrimônio total, e os outros 75% serão divididos
igualmente entre os descendentes, não importando se os descendentes receberão
uma quota inferior à do cônjuge.
A reserva da quarta parte tem por objetivo manter um mínimo
vital a favor do cônjuge/companheiro [1], no entanto, essa mesma proteção não se
observa quando o cônjuge/companheiro concorrer com descendentes exclusivos do
morto.
A situação fica ainda mais curiosa quando se trata de
filiação híbrida, que ocorre quando o cônjuge/companheiro concorre com
descendentes comuns (filhos do casal) e com os descendentes exclusivos do autor
da herança [2]. Tal situação jurídica não é tratada pelo
artigo 1832 do Código Civil, e por essa razão é que se faz necessário o
questionamento: em caso de filiação híbrida, é devida a reserva da quarta
parte?
Para responder o questionamento existem alguns posicionamentos.
O primeiro deles, defendido por Flavio Tartuce, Caio Mario, Maria Helena Diniz,
e outros, assegura que em caso de sucessão híbrida não há de se falar em
reserva da quarta parte ao cônjuge/companheiro [3]. Nesse caso, a herança seria dividia
entre todos os herdeiros necessários em iguais quotas, sob pena de violar o
princípio da igualdade entre os filhos.
Nesse mesmo sentido está o Enunciado 527 da V Jornada de
Direito Civil: "Na concorrência entre cônjuge e os herdeiros do de
cujus, não será reservada a quarta parte da herança para o sobrevivente no caso
de filiação híbrida".
Já o segundo posicionamento afirma que no caso de filiação
hibrida deve ser feita a reserva da quarta parte, agindo como se todos os
descendentes fossem comuns. Nesse posicionamento estão Francisco José Cahali,
Jose Fernando Simão e Silvio Venosa, que sustentam que a existência de filhos
comuns justificaria, por si só, a incidência da reserva [4], sendo esta uma interpretação extensiva
do artigo 1832 do Código Civil.
Para resolver essa controvérsia, em 2019 ficou decidido no
REsp 1617501 [5] que a interpretação mais
razoável do enunciado normativo do artigo 1832 do Código Civil é a de que
a reserva de um quarto da herança restringe-se à hipótese em que o cônjuge ou
companheiro concorrem com os descendentes comuns, conforme estabelecido no
enunciado 527 da Jornada de Direito Civil.
Segundo o julgado (REsp 1617501 [6]), a interpretação restritiva do artigo
1832 do Código Civil é o que assegura a igualdade entre os filhos e o direito
dos descendentes exclusivos de não redução do patrimônio de forma
injustificada.
Fonte: Consultor Jurídico