Em meio a um mundo de tantos atos de violência, crueldade e
desprezo pelo próximo, um comportamento que ainda navega pelos porões da
obscuridade é a alienação parental. Isto precisa mudar. A alienação parental
ocorre muito mais do que se imagina, e os dados oficiais são totalmente
subestimados, até pela vergonha que familiares têm em expor esse tipo de
ocorrência no seio dos lares.
É direito fundamental da criança e do adolescente o pleno
convívio com os seus genitores, através de uma convivência familiar saudável,
desde que, obviamente, o relacionamento com o pai e/ou mãe não traga nenhum
risco grave e efetivo contra a segurança do menor, situação esta que possui
tratamento apartado. Contudo, dentro de um padrão minimamente equilibrado de
comportamento, é inaceitável subtrair, de qualquer um dos genitores de uma
criança ou adolescente, ou mesmo de ambos, o direito à essencial convivência
com o seu filho. Nos termos da legislação brasileira, a criança é tida como até
12 anos de idade; o adolescente, dos 12 aos 18.
Normalmente a alienação parental acontece a partir do
momento em que pai e mãe começam a se desentender e abrem as portas para uma
situação de desfazimento conjugal, mesmo que, inicialmente, continuem a morar
sob o mesmo teto; da mesma forma em processos de divórcio, quando é discutida a
guarda e regime de visitação de filhos, não raramente vemos um dos genitores,
no afã de vencer a batalha pelos filhos, impor atos de alienação parental
visando ter vantagens na discussão enfrentada; ou, por simples raiva do outro,
pai ou mãe transformam os filhos em “arma” para se vingar do outro em
decorrência das frustrações trazidas pelo casamento que, àquela altura, já
desabou.
Definição legal de alienação parental: artigo 2º. da Lei
12.318/2010: Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação
psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos
genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua
autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo
ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
A alienação parental, a meu ver, consiste em abuso moral
contra a criança ou adolescente.
Muito comum, nesses casos, que um dos pais passe a manipular
os filhos para que estes se afastem e, até mesmo, odeiem o outro; inicialmente
sutil, o alienador procura desmerecer o outro genitor diante dos filhos,
menosprezando-o e tornando evidentes suas fraquezas, desvalorizando suas
qualidades enquanto pai ou mãe e ser humano; aos poucos, vai se tornando mais
ostensivo, impedindo o contato e rompendo os vínculos entre o alienado e os
filhos. A alienação parental é, em si, um fator desestabilizante, que prejudica
o desenvolvimento dos filhos envolvidos, bem como também o alienado e o
alienador, impedindo que prossigam com suas vidas e assimilem o luto pela
separação. (Carla Moradei Tardelli)
Fatos que, na prática, podem caracterizar a alienação
parental: realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no
exercício da paternidade ou maternidade; dificultar o exercício da autoridade
parental; dificultar contato de criança ou adolescente com genitor; dificultar
o exercício do direito regulamentado de convivência familiar; omitir
deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a criança ou
adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço; apresentar
falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós, para
obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente; mudar o
domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a
convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste
ou com avós (parágrafo único, artigo 2º. da Lei 12.318/2010).
Havendo provas ou indícios de alienação parental, o
prejudicado pode levar a questão perante o Juiz de Família (se estiver em curso
processo de divórcio ou guarda de filhos) ou o Juiz da Infância e Juventude,
nos demais casos. Para aferir a verdade do alegado, havendo ao menos indícios
de sua ocorrência, o juiz determinará uma perícia sob a forma de avaliação
psicológica ou biopsicossocial; a perícia poderá ser feita por uma equipe
multidisciplinar, formada por profissionais de distintas áreas, conforme a
necessidade de cada caso; durante a perícia serão avaliadas as partes, os
filhos, documentos, ambientes e o que mais for necessário à conclusão técnica e
expedição do respectivo laudo.
Ficando demonstrada a alienação parental, o alienador estará
sujeito a diversas medidas punitivas a serem aplicadas pelo juiz, de acordo com
o prejuízo e riscos auferidos: declarar a ocorrência de alienação parental e
advertir o alienador; ampliar o regime de convivência familiar em favor do
genitor alienado; estipular multa ao alienador; determinar acompanhamento
psicológico e/ou biopsicossocial; determinar a alteração da guarda para guarda
compartilhada ou sua inversão; determinar a fixação cautelar do domicílio da
criança ou adolescente; declarar a suspensão da autoridade parental; inverter a
obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do
genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar
(artigo 6º. da Lei 12.318/2010).
Claro que o acusado como alienador terá, no curso desse
processo de avaliação e julgamento, o direito à mais ampla defesa,
contraditório e produção de provas, inclusive a indicação de profissionais de
sua confiança que possam atuar como assistentes técnicos.
Fonte: Folha Vitória