A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
concluiu que a prestação deficitária ou incompleta só representa cumprimento
parcial da obrigação quando atende à necessidade do credor; do contrário,
estará configurado inadimplemento total. Para o colegiado, a distinção entre
cumprimento parcial e inadimplemento total de um contrato deve levar em conta a
intenção das partes no momento da contratação.
O tema foi debatido no julgamento do recurso de uma
indústria de autopeças contra empresa de software contratada para
desenvolver um sistema de gestão integrada.
A contratante afirmou que, até 2009, utilizava programas de
computação desenvolvidos por ela mesma, mas, necessitando de um sistema que
promovesse a integração de seus diversos setores, contratou a empresa
especializada. Segundo ela, porém, a contratada entregou um sistema que nunca
chegou a funcionar e ainda prestou de forma deficitária muitos dos serviços
correlatos.
A empresa de informática, por sua vez, asseverou que os
sistemas foram efetivamente entregues, customizados e implantados, tanto que
houve confissão de dívida pela contratante.
Intenção d???as partes
Em primeiro grau, ao julgar improcedente a ação de resolução
de contrato ajuizada pela fabricante de autopeças, o juiz entendeu que a
empresa de software não deixou de cumprir suas obrigações, porque o
sistema só não teria sido posto totalmente em operação devido às muitas
modificações que a cliente requereu.
O tribunal estadual manteve a sentença sob o fundamento de
que houve adimplemento substancial do contrato, circunstância reconhecida na
assinatura da confissão de dívida.
Para o ministro relator do caso, Moura Ribeiro, o fato de as
instâncias ordinárias terem afirmado, com base nas provas, que
o software foi desenvolvido e implementado parcialmente não
significa, necessariamente, que houve adimplemento parcial da obrigação.
O magistrado explicou que, para distinguir o cumprimento
parcial do inadimplemento total, é preciso levar em conta a finalidade das
partes no momento da contratação e a efetividade, para o credor, do produto ou
serviço entregue.
Prestação t??ardia
O ministro salientou que o atraso no cumprimento de uma
obrigação somente se constitui verdadeiramente em mora – caracterizando o
cumprimento parcial, mas em atraso – quando ainda há interesse jurídico do
contratante no cumprimento intempestivo daquilo que falta. Caso contrário,
tem-se a hipótese de inadimplemento.
"Se a prestação realizada sem proveito para o credor em
razão do momento em que verificada configura descumprimento da obrigação – isto
é, verdadeiro inadimplemento –, da mesma forma, aquela realizada igualmente sem
proveito para o credor em razão do modo como executada deve ser também
considerada inadimplemento", entendeu o relator.
Moura Ribeiro apontou que, conforme o acórdão do tribunal de
origem, a perícia apurou que o novo sistema não funcionou direito ou, pelo
menos, não funcionou da maneira esperada. Assim, segundo o relator, os serviços
prestados pela empresa de software não atingiram o objetivo precípuo
da contratação: a elaboração de um sistema eletrônico integrado de gestão
empresarial que otimizasse o funcionamento dos diversos setores da contratante.
"De certa forma, quem se compromete a desenvolver um
sistema de computador para fomentar a atividade empresarial de determinada
sociedade assume uma obrigação de resultado, pois, conquanto não esteja
obrigado a propiciar efetivamente resultados financeiros positivos, está sim
obrigado a entregar uma ferramenta que atenda às especificações técnicas
previstas no contrato."
Acompanhando o relator, a Terceira Turma determinou a
resolução do contrato, a devolução do valor pago e a extinção da execução
movida pela contratada com base na confissão de dívida.
Leia o acórdão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1731193
Fonte: Superior Tribunal de Justiça