A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em
julgamento sob o rito dos recursos especiais repetitivos (Tema
985), estabeleceu a tese de que o reconhecimento da usucapião
extraordinária, mediante o preenchimento de seus requisitos específicos, não
pode ser impedido em razão de a área discutida ser inferior ao módulo
estabelecido em lei municipal.
Com a fixação da tese, por unanimidade, mais de seis mil
ações que estavam suspensas nos tribunais do país – segundo informações
recebidas pelo Núcleo de Gerenciamento de Precedentes do STJ – poderão agora
ser resolvidas com a aplicação do precedente qualificado, que confirma
entendimento já pacificado nas turmas de direito privado.
Além disso, o colegiado levou em consideração precedente do
Supremo Tribunal Federal no RE 422.349, segundo o qual, preenchidos os
requisitos do artigo 183 da Constituição, o reconhecimento do
direito à usucapião especial urbana não pode ser impedido por legislação
infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos na área em que o imóvel está
situado.
Sem referências legais
De acordo com o artigo 1.238 do Código Civil, a usucapião
extraordinária pode ser reconhecida para aquele que exercer, durante 15 anos,
posse mansa, pacífica e ininterrupta. Ele poderá pedir ao juiz que declare a
propriedade por sentença, a qual servirá de título para o registro no cartório
de imóveis. Segundo o dispositivo, o prazo pode ser reduzido para dez anos, se
o possuidor morar no imóvel, ou realizar obras ou serviços de caráter produtivo
no local.
Segundo o relator dos recursos especiais, ministro Luis Felipe
Salomão, caso o legislador quisesse estabelecer parâmetros mínimos para a
usucapião de área urbana, certamente o faria de forma expressa, a exemplo da
definição de limites territoriais máximos para a usucapião especial rural,
prevista no artigo 1.239 do Código Civil.
"Considerando que não há na legislação ordinária,
própria à disciplina da usucapião, regra que especifique área mínima sobre a
qual deva o possuidor exercer sua posse para que seja possível a usucapião
extraordinária, a conclusão natural será pela impossibilidade de o intérprete
discriminar onde o legislador não discriminou", afirmou.
Cidade e propriedade
Ainda de acordo com o ministro, na decisão do STF no RE
422.349, estabeleceu-se a inexistência de inconstitucionalidade na lei
municipal que fixa o módulo urbano em área superior a 250 metros quadrados,
desde que isso não impeça ao particular a aquisição do direito de propriedade
de área menor, no caso de o órgão de controle não questionar a aquisição no
prazo legal.
Além disso, Salomão destacou que o parcelamento do solo e as
normas de edificação são providências relativas à função social da cidade. Por
outro lado – explicou –, a usucapião tem por objetivo a regularização da posse
e, uma vez reconhecida judicialmente, assegura o cumprimento da função social
da propriedade.
"A função social da cidade não se efetiva de maneira
apartada da função social da propriedade. Aliás, certo é que ambos os
institutos são membros de um mesmo corpo e que a realização coordenada de ambos
sempre promoverá um bem maior", apontou o ministro.
Nesse cenário, o relator entendeu que o reconhecimento do
direito à usucapião extraordinária se condiciona apenas ao preenchimento dos
requisitos do artigo 1.238 do Código Civil.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1667843REsp 1667842
Fonte: Superior Tribunal de Justiça