O
herdeiro que seja autor, coautor ou partícipe de ato infracional análogo ao
homicídio doloso praticado contra os ascendentes fica excluído da sucessão.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
Cinge-se
a controvérsia a definir se o ato infracional análogo ao homicídio, doloso e
consumado, praticado contra os pais, está abrangido pela regra do art. 1.814,
I, do CC/2002, segundo a qual será excluído da sucessão o herdeiro que seja
autor, coautor ou partícipe de homicídio doloso, consumado ou tentado, contra
os ascendentes de cuja sucessão se trata.
Na
esteira da majoritária doutrina, o rol do art. 1.814 do CC/2002, que prevê as
hipóteses autorizadoras de exclusão de herdeiros ou legatários da sucessão, é
taxativo, razão pela qual se conclui não ser admissível a criação de hipóteses
não previstas no dispositivo legal por intermédio da analogia ou da
interpretação extensiva.
Contudo,
o fato do rol ser taxativo não induz à necessidade de interpretação literal de
seu conteúdo e alcance, uma vez que a taxatividade do rol é compatível com as
interpretações lógica, histórico-evolutiva, sistemática, teleológica e
sociológica das hipóteses taxativamente listadas.
A
diferenciação entre o texto de lei, enquanto proposição física, textual e
escrita de um dispositivo emanado do Poder Legislativo, e a norma jurídica,
enquanto produto da indispensável atividade interpretativa por meio da qual se
atribui significado ao texto, conduz à conclusão de que a interpretação literal
é uma das formas, mas não a única forma, de obtenção da norma jurídica que se
encontra descrita no dispositivo em análise.
A
regra do art. 1.814, I, do CC/2002, se interpretada literalmente, prima facie,
de forma irreflexiva, não contextual e adstrita ao aspecto semântico ou
sintático da língua, induziria ao resultado de que o uso da palavra homicídio
possuiria um sentido único, técnico e importado diretamente da legislação penal
para a civil, razão pela qual o ato infracional análogo ao homicídio praticado
pelo filho contra os pais não poderia acarretar a exclusão da sucessão, pois,
tecnicamente, homicídio não houve.
Registra-se
que a exclusão do herdeiro que atenta contra a vida dos pais, cláusula geral
com raiz ética, moral e jurídica existente desde o direito romano, está
presente na maioria dos ordenamentos jurídicos contemporâneos e, no Brasil,
possui, como núcleo essencial, a exigência de que a conduta ilícita do herdeiro
seja dolosa, ainda que meramente tentada, sendo irrelevante investigar se a
motivação foi ou não o recolhimento da herança.
A
finalidade da regra que exclui da sucessão o herdeiro que atenta contra a vida
dos pais é, a um só tempo, prevenir a ocorrência do ato ilícito, tutelando bem
jurídico mais valioso do ordenamento jurídico, e reprimir o ato ilícito
porventura praticado, estabelecendo sanção civil consubstanciado na perda do
quinhão por quem praticá-lo.
Assim,
se o enunciado normativo do art. 1.814, I, do CC/2002, na perspectiva
teleológica-finalística, é de que não terá direito à herança quem atentar,
propositalmente, contra a vida de seus pais, ainda que a conduta não se
consuma, independentemente do motivo, a diferença técnico-jurídica entre o
homicídio doloso e o ato análogo ao homicídio doloso, conquanto relevante para
o âmbito penal diante das substanciais diferenças nas consequências e nas
repercussões jurídicas do ato ilícito, não se reveste da mesma relevância no
âmbito civil, sob pena de ofensa aos valores e às finalidades que nortearam a
criação da norma e de completo esvaziamento de seu conteúdo.
Fonte:
Informativo de Jurisprudência do STJ