Apesar de alguns sustentarem que não
tem respaldo legal no momento, de acordo com a doutrina majoritária e face ao
previsto no artigo 426, do Código Civil, a renúncia de herança de pessoa viva
pode ser objeto de contrato particular, que no mínimo servirá de um bom
incentivo para a pessoa que assinou o contrato cumprir a sua promessa de não
suceder à herança do outro.
De qualquer forma, no futuro, pode a
legislação ser modificada, assim como foi em Portugal, ou, ainda, pode a
maioria da jurisprudência e da doutrina passarem a emtender possível tal
abdicação a essa concorrência sucessória por parte dos cônjuges.
Assim, se a intenção é não receber a
herança do outro, melhor que se faça um documento do que deixar a situação sem
nenhuma disposição nesse sentido.
E a existência de tal documento ainda
poderá interferir na questão da tributação do Imposto de Transmissão Causa
Mortis e Doação.
Quanto a questão tributária, relativa
ao ITCMD, o fato é que o direito a herança surge no momento do falecimento do
autor da herança (princípio da saisine). Dessa forma, no momento do falecimento
já ocorre a transferência legal da herança para os herdeiros, sendo estes
obrigados a recolher o imposto no momento de realizar a partilha no inventário.
Porém, é preciso que façamos a análise
das hipóteses que podem alterar o recolhimento do ITCMD após o falecimento do
autor da herança em razão da renúncia do herdeiro ou em razão da inexistência
de renúncia. Lembrando-se que a renúncia só será válida se feita por herdeiro
capaz e através de escritura pública ou termo judicial (artigo 1.806, do CC).
E mais, se a renúncia se der
extrajudicialmente, também será necessária a anuência presencial e expressa do
cônjuge do herdeiro renunciante (Resolução 35, de 24/4/2007, CNJ), exceto se o
regime de casamento for o da separação absoluta de bens.
Primeira, o que mais ocorre é a inexistência
de renúncia. Ela não é realizada previamente ao falecimento da herança e nem
posterior ao falecimento, neste caso, haverá a cobrança de um ITCMD apenas.
A segunda, menos comum, e a hipótese
que o herdeiro renuncia a herança após a realização dos primeiros atos do
inventário, após a aceitação tácita da herança, é a renúncia tardia, como é
caso, por exemplo, da renúncia realizada após apresentação da petição inicial
do inventário ou arrolamento. Neste caso, haverá a cobrança de dois ITCMD, um
referente ao repasse da herança para o herdeiro, outro inerente ao repasse da
herança do herdeiro para os demais herdeiros beneficiários da renúncia.
Saliente-se que a aludida renúncia, no caso, não é tida como renúncia mesmo,
mas sim como doação, por isso a cobrança de mais um imposto.
A terceira, e pouco comum, é a hipótese
do falecimento sem que exista renúncia prévia, mas o herdeiro renuncia a
herança toda sem destiná-la a algum herdeiro específico e assim faz como
primeiro ato do inventário (artigo 1.804, do CC), trata-se da renúncia
abdicativa. Neste caso, o renunciante não deve arcar com nenhum ITCMD, este
tributo só incidirá na oportunidade de transferência da herança renunciada aos
demais herdeiros, visto que esta herança retorna ao monte mor, para o bolo geral
de bens do falecido, para ser redistribuída, sem que haja assunção da herança
por aquele herdeiro que renunciou como primeiro ato do inventário.
A quarta, e também comum, é a renúncia
imprópria ou translativa, é aquela renúncia feita também após a aceitação
tácita e seguida de uma transferência gratuita para uma ou mais pessoas
determinadas (doação) ou de uma transferência não gratuita (cessão onerosa de
direitos hereditários). Aqui, o herdeiro renuncia após a apresentação da
primeira petição do inventário e ato seguinte transfere para um terceiro a
herança, sem beneficiar igualmente os demais herdeiros. Não se tem nesta
hipótese um renuncia estrito sensu mas uma doação para alguém especificamente
ou cessão onerosa de direitos.
A quarta, mais rara, é quando ocorre a
renúncia da herança do cônjuge vivo no pacto antenupcial realizado antes do
casamento ou da assinatura da escritura de união estável. Apesar do artigo 426,
do Código Civil, proibir o pacto que contenha herança de pessoa viva (pacta
corvina) o fato é que existe uma tendência da doutrina nacional e da legislação
internacional (a exemplo da lei portuguesa) de se permitir a renúncia de
herança do cônjuge vivo, premiando mais a liberdade de abdicar e a
contratualidade entre os cônjuges do que a interferência do estado legislador,
tudo isso justificado pela seguinte pergunta: por que razão posso abdicar dos
bens particulares do meu cônjuge quando escolho me casar no regime de separação
total de bens, mas não posso abdicar desses bens no caso de falecimento dele?
Em todos os casos, há de se respeitar o
direito dos credores do falecido ou dos credores do próprio herdeiro
renunciante. A renúncia não pode representar uma fraude ao credor (artigo
1.813, do CC), assim os credores podem manifestar a aceitação da herança
renunciada até o limite do seu crédito.