O patrimônio digital é realidade que será potencializada no metaverso.
Músicas, livros, fotos, perfis em redes sociais e contas de dados na nuvem são
bens digitais comuns. No metaverso, outras relações digitais e ativos com valor
econômico farão parte da vida, como criptomoedas, espaços e NFT. Logo,
discussões sobre sua herança devem ganhar cada vez mais destaque.
Há opiniões de que bens digitais compõem o todo
unitário da herança e devem ser partilhados entre os herdeiros, sobretudo se
houver conteúdo econômico. Há ainda visões de que os bens digitais não integram
a herança, pois a sucessão daria acesso indevido pelos herdeiros a dados
particulares do falecido, violando seu direito à intimidade. Termos e condições
de uso da plataforma podem ainda vedar ou limitar acesso ao conteúdo por
herdeiros. Os entendimentos não são antagônicos e devem ser compatibilizados.
Um mesmo perfil de rede social pode dar acesso a mensagens privadas, mas também
ter valor econômico por exploração comercial. Essas zonas cinzentas causam
insegurança.
Na ausência de lei sobre herança de patrimônio
digital, as discussões começaram a chegar ao judiciário, mas os precedentes
ainda são poucos e há julgados divergentes. Em um mesmo tribunal, pretensão de
acesso a bens digitais foram negadas com base em termos de uso da plataforma e
direitos da personalidade, mas há decisão de primeiro grau autorizando acesso
de herdeiro.
As soluções para planejamento podem variar. Por
exemplo, um testamento pode regular a destinação de bens digitais para evitar
discussões e cumprir a vontade do falecido, garantindo a sucessão ou protegendo
acesso a dados privados.
Há alguns projetos de lei sobre herança digital
com propostas divergentes. Dois preveem amplo acesso pelos herdeiros, salvo se
houver previsão contrária em testamento. Outro restringe a herança aos bens
digitais com valor econômico e determina a exclusão de contas digitais após a
morte do usuário, salvo se houver deixado manifestação diversa. Ainda assim,
haverá lugar para discussões sobre qualificação de bem digital como direito da
personalidade ou patrimonial.
A herança digital, inclusive no metaverso, também
pode ter implicações fiscais. O imposto estadual de herança e doações (ITCMD)
incide sobre quaisquer bens e direitos. Em princípio, embora ainda não haja
regulação, também onera patrimônio digital passível de sucessão e avaliação
pecuniária.
O ITCMD incide sob a lei do Estado do falecido,
onde se processa o inventário. Sua base é o valor real ou de mercado do bem ou
direito na abertura da sucessão, apurado em avaliação judicial e homologado
pelo juiz ou declarado pelo inventariante, podendo ser revisto pelo fisco.
Aqui, a tributação da herança digital e física se
assemelha. Apenas podem ser tributados bens e direitos que admitem valoração e
não são personalíssimos. Aqueles com negociação pública e liquidez têm
valoração mais fácil e segura. Mesmo assim, a falta de regulação dos ativos
negociados, como criptomoedas, pode dificultar a comprovação do valor.
Outro desafio é a volatilidade. O ITCMD incide na
abertura da sucessão, mas é devido no encerramento do inventário, que pode
demorar, sobretudo se for litigioso. No limite, havendo desvalorização, o valor
final do ativo poderia não ser suficiente sequer para pagar o imposto,
configurando confisco. Há discussões judiciais sobre esse tema envolvendo
herança de ações de companhia aberta. Risco semelhante vale para criptomoedas
ou outros ativos digitais voláteis.
Por fim, caso se possa considerar que um bem ou
direito digital se localiza no exterior e o inventário não se processou no
Brasil, não incidiria o ITCMD. Em 2021, o Supremo Tribunal Federal decidiu, com
repercussão geral, que os Estados não podem tributar heranças internacionais em
sucessões abertas desde aquela decisão até a edição de lei nacional ainda
pendente.
Como se verifica, os desafios sobre o tratamento legal e tributário da herança digital, já frequentes, agora inauguram um espaço novo, fértil e vasto com o metaverso. Eles reforçam que o patrimônio digital seja tratado como tema relevante em muitos planejamentos patrimoniais e sucessórios.
Fonte:
ConJur