Recentemente, o Supremo Tribunal Federal
julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão — ADO nº
67, ajuizada pela Procuradoria Geral da República, em maio de 2021,
reconhecendo a omissão do Congresso ante a falta de Lei Complementar que
regulamente a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doações
(ITCMD) sobre bens no exterior.
Na decisão, o STF estabeleceu o prazo de
12 meses, a partir da data de publicação da ata do julgamento de mérito da
referida ADO, para que o Congresso edite a Lei Complementar que deve
regulamentar a incidência do ITCMD nas hipóteses de 1) doador domiciliado ou
residente no exterior e 2) de cujus que possuía bens, era domiciliado ou
residente no exterior, ou ter inventário processado no exterior.
A criação dessa Lei Complementar está
prevista na Constituição, em seu artigo 155, inciso III, porém nunca foi pauta
de grandes debates.
Contudo, mesmo com a inércia do
legislador, os estados e o Distrito Federal há tempos tentam instituir a
cobrança aos contribuintes de uma parcela sobre a transmissão desses bens, com
a edição de normas locais, sob justificativa do exercício da prerrogativa
constitucional prevista no artigo 24, do mesmo diploma legal, que prevê que
ante a inexistência de lei federal que regulamente as normas legais, poderão os
estados exercer a competência legislativa plena, de forma a atender suas
peculiaridades e, também, com base no parágrafo 3º do artigo 34, do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) que apregoa que os estados
poderão editar leis de forma a regular a aplicação do sistema tributário
nacional.
Em razão dessa aparente competência
legislativa suplementar, o estado de São Paulo previa a hipótese de incidência
do ITCMD para os casos de doador/de cujus residente no exterior e, o bem objeto
de transmissão que se encontrasse em território do estado, ou quando o bem se
encontrasse no exterior, mas o donatário, herdeiro ou legatário tivessem
domicílio no estado, nos termos do artigo 4º, da Lei Estadual nº 10.705/2000.
Assim, tal disposição, preenchia a lacuna
causada pela ausência da Lei Complementar, de modo que passou a ser exigido dos
contribuintes paulistas o ITCMD sobre 1) doações recebidas de doadores no
exterior, 2) na transmissão causa-mortis de bens no exterior, 3) de cujus
domiciliado e residente ou que teve seu inventário processado no exterior.
Contudo, essa exigência sempre foi alvo de questionamentos na esfera judicial,
formando uma corrente jurisprudencial favorável, pró-contribuinte.
Diante de inúmeros processos dos
contribuintes, que obtinham êxito na alegação de que o imposto não poderia ser
exigido face a ausência de existência de lei complementar, o assunto atingiu a
alçada do STF por meio do Recurso Extraordinário nº 851.108/SP da Procuradoria
Geral do Estado de São Paulo. O julgamento ocorreu em 2021, com trânsito em
julgado em 25/05/2022, negando seguimento ao recurso e fixando a seguinte tese:
"TEMA nº 825 — É vedado aos Estados e
ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no artigo 155,
§1º, III, da Constituição Federal sem a intervenção da lei complementar exigida
pelo referido dispositivo constitucional".
Mesmo com a decisão favorável aos
contribuintes, a sua aplicação não é automática. Por outro lado, para os
contribuintes que contavam com decisão diversa à proferida para implementação
de planejamentos patrimoniais e sucessórios sem a exigência de edição de lei
complementar é recomendado que considerem, desta forma, buscar alternativas que
contemplem estruturas no exterior, de modo a evitar a tributação em território
nacional.
Atualmente, tramita na Câmara dos
Deputados, ainda em fase inicial, o projeto de Lei Complementar nº 67/2021, de
autoria do deputado Ricardo Barros (PP-PR) o qual, caso seja sancionado,
passará a prever as seguintes hipóteses de incidência de ITCMD:
"Na transmissão causa mortis de bens
imóveis e bens móveis, situados no exterior, em que o domicílio do de cujus
seja no Brasil, será devido ao estado de domicílio do de cujos. Já na
transmissão de bens imóveis e bens móveis situados no exterior e com domicílio
do de cujos no exterior, será devido ao estado do domicílio do sucessor."
Nas hipóteses de doação de bens imóveis
situados no Brasil, em que o doador seja domiciliado no exterior ou no Brasil,
o ITCMD é devido ao estado da localização do respectivo bem. Já na hipótese de
doação de bens imóveis e bens móveis, situados no exterior, o ITCMD é devido ao
estado de domicílio do donatário.
Em que pese as hipóteses do projeto de Lei Complementar acima, ainda que meramente especulativas, a decisão do STF já acarreta aumento de demandas nas áreas de Wealth Planning & Tax nos escritórios de advocacia, considerando a preocupação dos clientes para a implementação de planejamentos patrimoniais e sucessórios visando a melhor eficiência fiscal.
Fonte: ConJur