A Terceira Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) estabeleceu os critérios essenciais para reconhecimento,
abertura, registro e cumprimento de testamento escrito de próprio punho. Entre
os elementos destacados, estão a leitura e a assinatura do documento na
presença de testemunhas – ou a declaração de circunstâncias excepcionais que
justifiquem a sua ausência – e a aferição técnica da veracidade da assinatura
atribuída à testadora.
No julgamento, o colegiado fez uma
distinção entre os chamados vícios formais, relacionados a aspectos externos do
testamento particular – e, portanto, passíveis de serem superados –, e os
vícios formais-materiais, os quais não se limitam à forma do ato, mas
contaminam o seu conteúdo e o invalidam.
O caso em análise começou quando os irmãos
da autora da herança ajuizaram ação para reconhecimento da validade do
testamento, a qual foi julgada procedente, apesar de controvérsias sobre a
assinatura. Alegando a existência de diversos vícios, uma das irmãs, excluída
da partilha dos bens, apelou ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), mas
teve o recurso negado sob o argumento de que o juiz poderia mitigar um possível
excesso de rigor formal, desde que fosse assegurada a última vontade da
testadora.
Segundo o acórdão, a médica que acompanhou
o tratamento da autora da herança atestou as suas condições mentais, e uma
outra pessoa confirmou sua vontade de testar, reconhecendo tanto a assinatura
como a grafia no documento.
Flexibilização de exigências legais não
alcança testamento sem assinatura
Ao analisar o recurso especial, a
relatora, ministra Nancy Andrighi, ponderou que a jurisprudência do STJ
estimula a flexibilização das exigências para validação do testamento, buscando
o equilíbrio entre o cumprimento das formalidades indispensáveis e o
abrandamento de outras, de maneira que seja respeitada a última vontade do
falecido.
Nesse sentido, apontou, vícios puramente
formais seriam superáveis quando não houvesse dúvidas quanto à vontade do
testador. Como exemplo, ela citou o REsp 701.917, em que foi reconhecida a
legitimidade de um testamento particular sem o número mínimo de testemunhas,
tendo em vista que não houve contestação quanto à veracidade do seu conteúdo.
Por outro lado, explicou a ministra, a
corte não flexibilizou a exigência legal nos casos de testamentos sem a
assinatura do próprio testador, pois isso causaria "fundada dúvida acerca
da higidez da manifestação de vontade ali expressa" (REsp 1.618.754). Esse
é um exemplo de vício formal-material, que atinge diretamente a essência do
ato, inviabilizando o reconhecimento de sua validade.
Prova pericial seria instrumento ideal
para comprovar assinatura em casos litigiosos
No caso dos autos, a magistrada destacou
que o documento teria sido escrito de próprio punho pela autora da herança, sem
a leitura perante testemunhas – até porque não havia nenhuma presente –,
desobedecendo o que prescreve o parágrafo 1º do artigo 1.876 do Código Civil. A
relatora também lembrou que o instrumento alternativo para suprir a falta de
testemunhas – a declaração, na cédula testamentária, de circunstâncias
excepcionais que justificassem essa ausência – não foi utilizado.
Nancy Andrighi apontou, ainda, que não
houve apuração adequada sobre a veracidade da assinatura e que o TJMG se
contentou com os depoimentos da médica, responsável por atestar a capacidade
civil da responsável pela herança, sem fazer menção ao testamento; e da pessoa
que declarou conhecer a vontade de testar e reconhecer a assinatura e a grafia
da falecida no testamento.
Ao dar provimento ao recurso especial, a
relatora declarou que seria imprescindível, no mínimo, que não houvesse dúvida
acerca da veracidade da assinatura da testadora, mediante produção de prova
pericial – a qual, para ela, não é incompatível com procedimentos que começaram
como jurisdição voluntária e depois se tornaram litigiosos, em razão de
desacordo entre as partes.
Leia o acórdão do REsp 2.005.877.
Fonte: STJ