Analisar a
possibilidade de aplicação da teoria da perda de uma chance em Recurso Especial
equivaleria ao reexame de fatos e provas, prática vedada pela súmula 7 do
Superior Tribunal de Justiça.
Assim, a 3ª Turma
da Corte negou a aplicação da teoria por causa do extravio de dois livros com
informações societárias da Sadia que, em teoria, poderiam comprovar se duas
filhas do fundador da empresa, Attilio Fontana, foram prejudicadas por doações
acima do limite feitas em benefício de outros herdeiros.
Na manhã desta terça-feira (18/10), o colegiado não deu provimento ao recurso especial ajuizado pelas irmãs. Relator, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino manteve as conclusões das instâncias ordinárias, no sentido da inaplicabilidade da teoria da perda de uma chance.
Essa teoria prevê
que quem, de forma intencional ou não, retira de outra pessoa a oportunidade de
um dado benefício deve responder pelo fato.
As autoras da ação
foram reconhecidas como filhas no testamento lavrado um ano antes da morte de
Fontana, ocorrida em março de 1989. Com o inventário feito e partilha
homologada, elas receberam participação social de 0,19% das ações da
Sadia.
Seus outros seis
irmãos, nascidos de três casamentos do fundador da Sadia, ficaram com bem mais:
10% cada um. Para as autoras da ação, a diferença decorre de doações
inoficiosas — que excedem o limite que o doador poderia dispor sobre o próprio
patrimônio —, o que permitiria sua anulação via ação judicial.
Essas doações
teriam ocorrido em 1951 e 1970. A fim de obter informações, elas ajuizaram ação
cautelar de exibição de documentos contra a BRF (empresa que surgiu da fusão
entre Sadia e Perdigão). A empresa deixou de apresentar dois livros: um de
presença de acionistas e outro de transferências de ações. Eles teriam sido
extraviados.
Para as autoras, a
BRF, ao permitir o extravio de tais livros, levou à perda de uma chance de
reaverem dos demais herdeiros a participação social que lhes teria sido
ilicitamente doada por Attilio Fontana.
Nenhuma chance
Ao julgar o caso,
o Tribunal de Justiça de São Paulo negou o pedido. O tribunal entendeu que
nenhum dos pressupostos para a aplicação da teoria da perda de uma chance
estaria presente no caso.
Para as herdeiras,
seria necessário comprovar: a viabilidade e a probabilidade de sucesso de
futura ação declaratória de nulidade de doações inoficiosas; a viabilidade e a
probabilidade de sucesso de futura ação de sonegados; e a existência de nexo de
causalidade entre o extravio de dois livros da companhia e as chances de
vitória nas demandas judiciais.
"Nenhum dos três pressupostos acima se encontra presente", entendeu o TJ-SP. A corte analisou as provas e concluiu que não há indícios de que as doações ultrapassaram o limite disponível ao doador, inclusive porque sequer se sabe qual era o patrimônio total dele à época.
"Resta claro que as autoras não tinham chances reais e concretas de obter equalização dos quinhões", concluiu o relator no TJ-SP.
Essa conclusão não
foi revista pelo STJ, com base na da Súmula 7, que impede o reexame de fatos e
provas pela Corte.
"A escorreita
analise feita pelo acórdão concluiu pela não demonstração dos pressupostos
necessários ao reconhecimento da chance perdida pelas demandantes de
ajuizamento da ação judicial. Revisão desse fundamento exigiria reexame de
fatos e provas" concluiu o ministro Paulo de Tarso Sanseverino. A votação
foi unânime.
REsp 1.929.450
Fonte: ConJur