Advogado
explica como fica a divisão de bens nesse tipo de união – e orienta como casais
podem prevenir complicações legais em um eventual fim da relação
O número de
casais brasileiros que opta pela união estável no país não para de crescer. Só
no estado de São Paulo, as relações formalizadas em cartório subiram 35% no
primeiro semestre de 2021 em comparação com o mesmo período do ano passado,
segundo o Colégio Notarial do Brasil.
À medida que a
escolha por esse tipo de união se intensifica, também são mais comuns as
dúvidas a respeito dos direitos dos companheiros, especialmente em caso de
separação.
O que é a
união estável?
Antes de
falarmos sobre os diretos, no entanto, é importante entender o que configura,
de fato, uma união estável. São assim consideradas só as relações registradas
em cartório, por exemplo? Ou basta morar junto?
Segundo Felipe
Gontijo, advogado especialista em direito de família e sucessões, sócio do
escritório JF Gontijo, a lei define a união estável como a convivência pública,
contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituir família. Assim,
para que seja caracterizada, não é necessário qualquer contrato.
“Isso porque se
trata de uma relação fática – justamente o ponto central que a diferencia do
casamento, que é um contrato formal e solene. Assim, se estiverem presentes os
requisitos, é possível a configuração de união estável”, esclarece o
especialista.
O advogado
ressalta que é importante acabar com alguns mitos em torno dessa definição. “A
lei não estabelece um tempo mínimo de relacionamento nem é obrigatório morar
junto, embora seja um fator muitas vezes definidor da alteração de namoro para
união estável. Contudo, todos os requisitos são subjetivos e, na prática, a
configuração de união estável dependerá de um conjunto de circunstâncias
específicas de cada caso”, explica.
Como fica a
divisão de bens na união estável se o casal se separar?
Tanto no
casamento quanto na união estável, quando não houve uma formalização do regime
de bens escolhido, o modelo padrão é o da comunhão parcial. Nele, os bens
adquiridos por cada um após o relacionamento são considerados comuns ao casal
e, numa separação, serão divididos de forma igualitária entre os dois.
“Não devem ser
partilhados os bens que cada um já possuía antes, os bens adquiridos durante o
relacionamento como produto de venda desses bens anteriores e aquilo que for
recebido como herança ou doação, ainda que na constância do relacionamento”,
complementa Gontijo.
No casamento, os
noivos podem lavrar um pacto antenupcial no cartório antes, optando por regras
de divisão diferentes, em geral comunhão universal ou separação total de bens.
Já na união estável, explica o advogado, a qualquer momento os conviventes
podem celebrar um contrato de união estável alterando essa regra, dentro do que
for mais conveniente para eles.
“Vale esclarecer
que esse contrato não tem efeito retroativo, mas as partes podem dar quitação e
fazer o acordo da divisão quanto ao período do início do relacionamento até a
celebração desse contrato de união estável”.
Como funciona
a partilha dos bens?
O especialista
explica que as ações nesse caso são o reconhecimento e a dissolução de união,
para que possa ser feita partilha dos bens. “Na união estável, haverá a
discussão do termo inicial e final do relacionamento, devendo ser comprovado
quando o casal passou a preencher todos os requisitos legais e quando se
separaram”, comenta.
A duração do
relacionamento e a efetiva data da separação são fatores que influenciam
diretamente os bens que serão considerados comuns, já que o fim da relação põe
fim também ao regime de bens.
Se houver acordo
e as partes não possuírem filhos comuns menores de idade, é possível a
dissolução do relacionamento de forma simples, por escritura pública no
cartório.
“Além disso, os
Tribunais de Justiça possuem programas para soluções chamadas de
pré-processuais, em que se destacam os Núcleos Permanentes de Métodos
Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemecs) e Centros Judiciários de Solução
de Conflitos e Cidadania (Cejuscs), em que é facilitado o acesso à justiça para
os cidadãos evitando-se o litígio”, orienta Gontijo.
Como evitar
problemas legais quando acaba a união estável?
Para evitar
eventuais dificuldades no acesso aos direitos durante a separação, o especialista
afirma que a melhor opção é sempre reconhecer a união estável em escritura
pública, estabelecendo o termo de início e as regras patrimoniais que serão
usadas no relacionamento.
Mas infelizmente
ainda é um tabu para os casais conversar de maneira aberta e madura sobre
questões patrimoniais. “O famoso ‘o combinado não sai caro’ vale tanto para o
casamento quanto para a união estável”, salienta Gontijo.
Ele lembra que,
além de diminuir os pontos de controvérsia em caso de litígio, a escritura pública
facilita bastante o desembaraço também de questões relacionadas à previdência e
herança. Afinal, outra forma de extinção da união estável é com a morte, uma
situação imprevista que o casal deve levar em conta.
“O Superior
Tribunal Federal equiparou o regime sucessório da união estável ao casamento.
Mas, apesar disso, a natureza fática da união estável pode gerar complicações
adicionais para o companheiro sobrevivente, que precisa superar uma etapa
preliminar para comprovar a existência do relacionamento e que na época da
morte o casal estava efetivamente junto”.
O que muda na
união estável com filhos?
Gontijo deixa
claro que nas questões relativas aos filhos comuns não há nenhuma diferenciação
entre a união estável e o casamento.
“É necessário
estabelecer o tipo de guarda, preferindo-se sempre o compartilhamento entre os
genitores; o regime de convivência, também conhecido como a forma de
“visitação”; e os alimentos, popularmente chamados de pensão, que são fixados
dentro da proporcionalidade entre a capacidade de quem paga e das necessidades
de quem recebe”, diz.
Ele ressalta por
último que, nas questões que envolvem filhos menores, há necessidade de
intervenção obrigatória do Ministério Público e que o critério de orientação
para regulamentação é o superior interesse da criança e do adolescente. “Nesses
casos, não é possível que a dissolução da união estável seja feita por
escritura pública, mesmo que haja consenso entre os pais”, esclarece o
advogado.
Fonte: Exame