Aprovação do PL
3999/20 permitirá desjudicialização e aquecimento das locações
No último dia 9 de
novembro, foi apresentado parecer do relator da Comissão de Defesa do
Consumidor, deputado Celso Russomanno, pela aprovação do PL 3999/2020 (que
dispõe sobre o despejo extrajudicial), porém, com o substitutivo por ele
apresentado. E, como se demonstrará, trata-se de louvável substitutivo que vem
a lapidar o já brilhante projeto de autoria do deputado Hugo Leal, que teve por
base o anteprojeto de coautoria dos eminentes advogados Carlos Gabriel Feijó e
Arnon Velmovitsky.
O festejado PL foi
apresentado no dia 30/7/2020, não tendo sido apresentadas emendas a ele. Porém,
ante o mencionado substitutivo apresentado, reabre-se o prazo para emendas,
tendo como termo final cinco sessões a partir de 18/11/2022. Considerando a
inexistência de emendas ao projeto originário e que o aperfeiçoamento realizado
pelo substitutivo é irrecusável, a tendência é estarmos diante do texto final
da futura lei do despejo extrajudicial. Se avizinha, assim, o momento do
mercado imobiliário tornar-se mais dinâmico e dar o grande e esperado salto,
fruto do aquecimento das locações, ante a desjudicialização, em definitivo, do
despejo por falta de pagamento.
Em apertada síntese,
o projeto visa a conferir dinâmica às relações negociais locatícias.
Estamos na era dos
meios adequados de soluções de conflitos. Conflito posto, a sua pacificação
deve se dar pela via mais adequada. E, comprovadamente, a via mais adequada não
é a sua sanatória pela Jurisdição Estatal. Tal proposta vem na mesma via mestra
do divórcio extrajudicial (Lei 11.441/2007), do inventário e da partilha
extrajudiciais (Lei 11.441/2007), da alienação fiduciária (Lei 9.514/1997) e da
usucapião extrajudiciais (Lei 13.105/2015).
E aplica-se
faticamente ao locatário que estiver com o valor do aluguel atrasado. O
procedimento será feito por meio de cartório de notas, aproveitando-se a fé
pública delegada aos tabeliães, e com a presença obrigatória de advogado. Após
ser lavrada a ata, será feita a notificação do inquilino, de competência de
cartório de registro de títulos e documentos. O locatário terá como opção
realizar o pagamento ou desocupar o imóvel. Se não for realizada quaisquer das
condutas, será decretado o despejo, havendo, porém, para a efetivação dos atos
coercitivos de retirada compulsória do locatário, aí sim, e, só nesse momento,
a participação do Estado-Juiz.
Conforme indicado
pelo Censo de 2019, 18,34% dos imóveis residenciais do país são locados, de
modo que o impacto quando da implementação do despejo extrajudicial na economia
será enorme. Além disso, conforme indicado pelo Secovi-Rio e pela Associação
Brasileira Administradoras de Imóveis, 76,7% das locações residenciais são
relativas a locador possuidor de um imóvel e dependente do valor do aluguel
para a sua subsistência. Há esse claro reflexo social, já que a retomada rápida
do imóvel viabiliza a utilização deste para novos contratos, dinamiza a renda e
fortalece o mercado imobiliário pela garantia de segurança jurídica criada
quanto à desocupação eficaz.
Tudo isso gerará mais
investimentos imobiliários visando a novas aquisições de imóveis geradores de
renda passiva.
O substitutivo lapida
o projeto originário, pois, de início, prevê a supressão do ponto em que o
projeto impunha a necessidade de prova de tentativa de negociação por parte do
locador. Ora, tal exigência vai de encontro com o espírito do projeto, resulta
em morosidade e emperra o sistema, mesmo porque ao haver escusa do locatário ao
se tornar incomunicável ou não localizável, poderia ter-se como não configurada
essa possibilidade de negociação. Além disso, a negociação poderá se dar no
decorrer do procedimento de despejo, sendo desarrazoado a impor como condição
para início do mesmo.
Ponto omisso no
projeto e que vem a ser agregado com o substitutivo, refere-se à indicação de
que a notificação do locatário deverá ser feita preferencialmente pela
modalidade pessoal, admitindo-se a notificação por hora certa, sempre que
configurados os requisitos legais, ou pelas demais modalidades quando a
notificação pessoal tiver resultado negativo.
Do mesmo modo,
omissão suprida é a relativa à disposição de que, se constar da ata notarial
que o imóvel não está ocupado por ninguém, o juiz deferirá liminarmente o
despejo, antes mesmo da citação do locatário, podendo, neste caso, o locador
ingressar imediatamente na posse direta do imóvel. A celeridade alcançada será
a máxima possível. Já, se constar da ata notarial que o imóvel está ocupado por
pessoas diversas do locatário, o juiz deferirá liminarmente o despejo, antes da
citação do locatário e de eventuais outros ocupantes do imóvel indicados na ata
notarial, cabendo ao Oficial de Justiça cumprir a ordem judicial com urgência,
no prazo máximo de 15 dias.
Além disso, o
substitutivo prevê que os bens móveis presentes no imóvel deverão ser retirados
pelo locatário no prazo máximo de 30 dias, mediante pagamento do custo de
armazenamento, sob pena de serem considerados abandonados.
Crítica necessária,
porém, se dá quando da inclusão de que a devolução do imóvel não afasta
eventuais outras obrigações contratuais ou legais do locatário, incluindo
“contas de água e luz”. Trata-se de disposição inócua e sem qualquer efeito
prático. Em duas palavras: inadequada e desnecessária. Diz-se isso, pois as
contas de consumo não acompanham o imóvel. São obrigações pessoais, logo não
afetam o imóvel de qualquer forma que seja, restringindo-se ao campo
obrigacional pessoal do locatário.
Por fim, motivo de
aperfeiçoamento é a disciplina legal em compasso com o modo que já vem
caminhando a jurisprudência pátria, no sentido de prever que a notificação
pessoal feita em condomínio edilício, loteamento e demais locais com controle
de acesso que impeça a entrada do notificador, será efetivada por meio da
entrega a funcionário da portaria ou ao responsável pelo recebimento de
correspondências. Ou seja, é anulada a ocultação de má-fé pelo locatário,
considerando lícita a notificação feita ao porteiro onde situa-se o imóvel
locado.
Num país com uma
produção legislativa tão intensa e muita das vezes desnecessária e contraditória
entre si em razão da falta de harmonia dentro desse emaranhado de leis, está a
florescer esta futura lei, absolutamente necessária e tão esperada pela
comunidade jurídica e pelo mercado imobiliário. Que a celeridade, essência do
projeto, também possa ser aplicada quanto à sua tramitação. Passados mais de
dois anos da sua propositura, aprovação breve é medida que se impõe.
*Gabriel de Britto
Silva é especializado em direito imobiliário e advogado no escritório RBLR
Advogados.
Fonte: JOTA