Resolução publicada pelo Conselho Nacional de
Justiça, que permite a realização de divórcio e inventário…
Você sabia que os cartórios brasileiros são
autorizados a realizar divórcio e inventário? A lei nº 11.441, de 2007,
autorizou os cartórios a lavrar escrituras de inventário, divórcio, partilha de
bens e união estável em cartório. No entanto, a lei não se estendia a processos
com menores de idade ou incapazes, que não podiam ser feitos no cartório.
Neste ano, uma resolução do Conselho Nacional de
Justiça autorizou que os cartórios incluíssem esse atendimento a processos que
tenham menores de idade. De acordo com a tabeliã Flávia Scanavachi, do 1º
Tabelionato de Notas de Irati, o Cartório Scanavachi, o uso de cartórios em
processos extrajudiciais tem o objetivo de agilizar o Judiciário. “É mais uma
evolução do extrajudicial, do procedimento de desjudicialização dos processos,
a fim de desafogar o Poder Judiciário”, conta.
A principal mudança acontece nos processos de
inventário e na partilha de bens de pessoas que deixaram menores ou incapazes
como herdeiros. Agora, os herdeiros podem conseguir vender um bem para custear
o processo. “Por vezes, a pessoa que faleceu não deixou um dinheiro depositado
em banco. Ele deixou imóveis, ele deixou o carro. Não tem como ter um dinheiro
para sacar e a família que está recebendo aqueles bens em inventário não tenho
dinheiro para fazer o inventário, de certa forma, travaria o procedimento. Vem
mais essa inovação: a possibilidade de vender um bem móvel ou imóvel para pagar
as custas decorrentes do inventário. Se a pessoa falecida deixou três bens. A
família pode escolher um bem para poder ver se aquele valor vai ser congruente
com os valores que serão gastos. Através disso, a família nomeia o
inventariante para que ele possa fazer a venda desse imóvel e o dinheiro desse
imóvel vendido é que vai pagar as custas cartorárias, impostos e honorários
advocatícios”, explica Flávia.
Desde 2022, os herdeiros podem nomear um
inventariante que podia usar uma conta bancária para pagar os custos. “Em 2022,
já veio a possibilidade de nomear um inventariante do espólio, da pessoa
falecida, para que ele pudesse levantar valores em contas bancárias, a fim de
pagar impostos ou as custas cartorárias. Esse dinheiro poderia ser sacado para
esse fim: pagar o valor das custas cartorárias e os impostos”, conta a tabeliã.
Esse inventariante pode ser um membro da família.
“No Código de Processo Civil, traz uma ordem de nomeação de inventariantes para
quem vai fazer o processo judicial. Na via extrajudicial não existe uma ordem
de nomeação de inventariante, mas geralmente nomeia-se aquela pessoa que é mais
próxima. Pode ser um filho, a esposa, a viúva ou a viúvo para poder resolver
essas questões do inventário. É possível nomear um inventariante ainda que ele
não faça parte do procedimento, apenas para resolver essas questões, tanto
burocráticas, documentação, em banco, em Receita Federal, como também nos
cartórios. Nomeia-se o inventariante”, disse Flávia.
Apesar da permissão da nomeação de um inventariante,
não era permitido a venda de bens para custear o processo. “Em relação ao
inventário, antes não era permitido que se fizesse a venda de nenhum bem, móvel
ou imóvel, para poder fazer pagamento dos impostos e das custas do inventário.
Isso acabava dificultando muito porque nem sempre as famílias têm dinheiro para
realizar o inventário. A pessoa que faleceu deixou bastante posse, mas quem
está recebendo não tem um valor, em espécie, porque aquele ativo que a pessoa
deixou, não é um ativo monetário. Por vezes são imóveis ou carro, que não dava
para ser vendido. Eles não tinham dinheiro para fazer esse procedimento na via
extrajudicial”, conta.
A atualização na Resolução nº 35 permite que os
herdeiros usem este recurso para custeio. “Todo e qualquer despesa decorrente
do inventário vai poder ser utilizado esse valor que está depositado em uma
conta bancária, principalmente, além das despesas cartorárias e dos impostos,
mas também as custas dos honorários advocatícios, pedido de certidão, todas as
custas relacionadas a isso, agora pode ser realizado por esse meio, através da
nomeação de inventariante”, explica a tabeliã.
No caso dos imóveis que forem vendidos para arcar
esses custos, há algumas especificações, conforme Flávia. “Nessa escritura de
venda desse imóvel, fora do inventário, traz alguns requisitos como a
vinculação desse valor tem que ser para pagamento, seja total ou parcial,
dessas custas. O que sobrar tem que voltar para o inventário. Esse imóvel
vendido, no ato da lavratura do inventário, ele não é mais partilhado porque
ele já foi vendido para pagamento das custas. Ele é apenas arrolado no imóvel,
para fins do inventário, para fins de cobrança de impostos, custas cartorárias
e para constar todos os valores que foram utilizados, como uma prestação de
contas por parte do inventariante. Além disso, o inventariante que for efetuar
a venda desse imóvel, se responsabiliza pela venda desse imóvel, ele tem que
prestar uma garantia, seja real ou fiduciário, a fim de que fique resguardado
que aquele dinheiro vai ser vinculado ao pagamento dessas custas. Ele tem que
prestar uma garantia dele”, conta.
Há um prazo para que o inventariante pague os
custos. “O pagamento dessas custas, a nova resolução também traz que esse
pagamento tem que ser efetuado dentro do prazo de um ano. Ele não pode vender o
imóvel e ficar com esse valor por cinco ou dez anos. Dentro de um ano, tudo
isso tem que ser resolvido. Claro que dá para ser resolvido muito antes disso
porque se ele estiver com valor dá para quitar bem rapidamente”, relata Flávia.
Outra possibilidade é fixar um tempo específico,
menor de um ano, para o pagamento das despesas. “Na escritura que autoriza a
venda do imóvel para poder usar os valores para pagar as dívidas, podem também,
os interessados constar, que o inventariante tem um prazo menor que um ano para
pagar. Pode constar, por exemplo: ‘Eu quero que você pague em 15 dias após a
lavratura da escritura e recebimento do valor, que você pague as custas para
que consigamos finalizar com mais agilidade o procedimento’”, conta.
A tabeliã diz que as custas cartorárias ou o valor
do imposto podem ser feitas por estimativas. “Tudo isso tem que constar nessa
escritura que vai ser lavrada. Tem que constar as guias do imposto de TCMD, que
é do imposto de Transmissão, Causa-Morte, com o valor que vai ser pago, porque
ainda está dependendo desse dinheiro que vai receber, tem que constar uma
estimativa oferecida pelos cartórios, que vão lavrar escritura e para o
registro de imóveis, também pelas custas do registro. Através dessas estimativas,
é que vai saber o valor que realmente vai utilizar. Depois vai ter uma
prestação de contas. Essa foi realmente uma inovação muito boa e muito grande
que vai ajudar muito os advogados a poder resolver muitos problemas que estavam
parados, por vezes, por ano”, disse.
Outra novidade atinge os processos de inventários
com menores de idade ou incapazes. Os inventários também podem ser feitos nos
cartórios. “Essa possibilidade de lavrar inventários e partilha de bens, com
menores ou incapazes, também tem que observar alguns requisitos. O Ministério
Público, como fiscal da lei, sempre tem que estar presente em atos que envolvam
menores ou incapazes. Essa resolução trouxe essa possibilidade, mas condicionou
ao envio para o Ministério Público para poder analisar se realmente está em
acordo com aquela partilha”, conta.
Isso não era possível anteriormente, o que levava
muitos processos para a justiça. “Existem muitos inventários que estão sendo
feitos na via judicial em decorrência disso. A própria resolução (já era
permitido) autoriza que peça suspensão desses processos judiciais ou a extinção
deles, a suspensão pelo prazo de 30 dias ou a suspensão deles, para que seja
resolvido da forma extrajudicial agora. É uma forma mais rápida, não precisa de
intimação, não precisa aguardar todos os procedimentos da via judicial. É possível
que se faça a desistência ou o pedido de suspensão desses processos judiciais,
para que seja resolvido na via extrajudicial”, explica.
Nos processos com menores de idade ou incapazes é
preciso verificar como ficará a partilha de bens. “Um dos requisitos para que
possa ser feito também na via extrajudicial é que a partilha de bens, deixados
pela pessoa falecida, no que se refere aos menores incapazes, eles têm que
receber o seu quinhão, a parte que lhe cabe no inventário, exatamente a
quantidade certa e discriminada dele, em cada bem. Vamos supor: deixou três
herdeiros e deixou três imóveis. Um dos herdeiros é menor incapaz. Não pode deixar
para o herdeiro A, B ou C, o imóvel A, B e C. O herdeiro A, fica com o imóvel
A, o B com o imóvel B e o C, com o imóvel C. Não é dessa forma. O menor incapaz
tem que ficar com a porcentagem dele em cada um dos bens porque pode ter bem
com valor maior ou valor menor. Para que não haja prejuízo para ele, tem que
ficar com a sua cota ou parte em cada um dos bens”, disse Flávia.
Durante o processo, o menor ou incapaz não pode ter
perdas no seu patrimônio. “O irmão dele está no inventário e ele quer ceder a
parte dele para outra pessoa. Se não influenciar na cota parte do menor ou
incapaz, perfeitamente possível, mas tudo isso tem que ser alinhado com o
Ministério Público. Ainda há bastante discussão no meio notarial e registral se
seria necessário esse envio para o Ministério Público antes de lavrar a
escritura ou após a lavratura da escritura. Ficamos aguardando. Nós já temos a
notícia de que o Conselho Nacional do Ministério Público está com uma resolução
pronta, uma minuta pronta, para ser publicada para falar como é que vai ser. Se
a escritura tem que ser enviada uma minuta prévia ou se tem que se lavrar
primeiro a escritura, para depois mandar para o Ministério Público dar o
parecer dele, se está tudo ok, para poder continuar com o procedimento”,
explica.
A tabeliã acredita que, nesses casos, é possível que
tenha que se levar antes o processo ao Ministério Público. “Ao que me parece as
notícias que eu tive é de que esse procedimento tem que ser prévio. Então, veio
para o cartório os documentos. Nós vamos lavrar uma minuta, envia para o
Ministério Público. O Ministério Público dá o seu parecer. Se for favorável,
nós lavramos a escritura e seria tranquilo. Caso o Ministério Público se
oponha, acho que seria muito difícil se opor, a menos que o tabelião fizesse
uma partilha desigual para o menor ou incapaz. Se, eventualmente, isso
acontecer, é um procedimento administrativo também que o tabelião envia para o
juiz para poder apreciar. Se o juiz apreciar, ver que não tem nenhum problema,
ver que está tudo correto, volta e nós conseguimos lavrar. Se, por ventura,
tiver alguma coisa bem pontual ou bem gritante e o juiz disser que não dá para
continuar o procedimento no extrajudicial, nós vamos ter que fazer no judicial.
Mas não teria custo porque a escritura não chegou nem a ser lavrada. Também é o
ônus e o bônus do tabelião. Vai dar certo ou não vai, mas ele tem que estar
sempre respaldado legalmente nessas questões”, afirmou.
No caso de herdeiros que ainda não tenham nascido, o
inventário só pode ser realizado após o nascimento do bebê. “Se, por ventura, o
falecido deixou uma mulher grávida. A pessoa está grávida, como é que vai
fazer? Vai poder fazer o inventário extrajudicial? Não. Primeiro tem que
aguardar o nascimento da criança para saber se ela nasceu com vida ou não
porque o fato dela nascer, com vida ou não, também influencia na questão
sucessória. Também tem que ser observado essa questão”, conta Flávia.
Quem estava em união estável também precisa prestar
atenção em alguns detalhes. “Para provar a união estável com quem faleceu, para
fazer um inventário na via extrajudicial, consta na Resolução nº 35 que é
necessário que se tenha uma escritura pública lavrada de união estável, que ela
seja registrada em um livro específico do registro civil de pessoas naturais,
para dar publicidade perante terceiros, antes da lavratura do inventário. ‘Mas
tem menor e incapaz, não tem uma escritura, mas todos os herdeiros estão
concordando que essa pessoa vivia em união estável com ele. Pode ser lavrado na
via extrajudicial? Pode, desde que respeitado também os requisitos referentes
aos menores e incapazes”, disse.
Pessoas que deixaram testamentos também podem fazer
o inventário em cartório. “Também pode lavrar inventários, na via
extrajudicial, nos casos em que a pessoa deixou um testamento. É perfeitamente
possível. Basta que o testamento seja levado ao juiz para que haja aprovação e
registro no livro de testamento judicial. ‘Mas se vai levar o inventário para o
juiz analisar o testamento, já não dá para fazer um inventário lá?’. Dá, só que
o procedimento de só de autorizar que o testamento seja lavrado na via extrajudicial
é muito mais rápido. O juiz autoriza esse procedimento bem rapidinho, que
registra o testamento e autoriza que seja feito na via extrajudicial”, explica.
Quanto aos divórcios, a atualização na resolução
trouxe a possibilidade de fazer o divórcio extrajudicial no cartório, mesmo
tendo filhos com menores de idade ou incapazes. No Paraná, isso já acontecia.
“No que se refere ao divórcio com filhos menores ou incapazes, já era permitido
desde o ano passado no estado do Paraná, através do Código de Normas do Foro
Extrajudicial, já era permitido que fosse lavrado divórcios na via
extrajudicial com menores incapazes. Mas com alguns requisitos: desde que a
guarda, o alimento e a pensão dos menores fossem resolvidos na via judicial
primeiro, para depois constar essa decisão no procedimento de inventário na via
extrajudicial. Em relação a isso, não mudou. Continua sendo assim. Precisa
resolver a guarda, a visita e alimentos dos menores e incapazes na via judicial
para realizar o divórcio no extrajudicial, em cartório”, disse.
A tabeliã destaca que é preciso separar os processos
de inventário e de divórcio. “Não podemos confundir a hipótese de como lavrar
inventário e o divórcio extrajudicial com menores incapazes. No inventário,
necessariamente, precisa do Ministério Público e pode fazer na via
extrajudicial. O divórcio primeiro tem que resolver guardas, alimentos e pensão
na via judicial”, explica.
Um dos serviços prestados no cartório é o registro
de separação de fato. “A separação de fato é exclusivamente para falar que
cessou a comunhão de vida do casal. Por exemplo, ele quer fazer o divórcio
dele, ele quer fazer todo o procedimento, por vezes, tem que resolver algumas
questões pontuais patrimoniais, entre os dois, em relação aos filhos menores,
que precisa resolver na via judicial. Dá para fazer essa escritura declaratória
de separação de fato unicamente para dizer: estamos de fato separados de corpos,
cessou a comunhão plena de vida entre nós. Para quê? Por ventura, a pessoa não
está mais com a outra, já teve essa separação, mudaram de casa, não estão mais
juntos. Mas ele quer comprar um imóvel e ele não tem o divórcio ainda com essa
pessoa. Ele fala: ‘Se eu comprar um imóvel hoje e eu estou casado com ela, vai
comunicar o meu casamento com ela. Eu vou ter que dividir esse bem com ela
depois’. Essa escritura é uma prévia que demonstra, ela é uma prova, para
demonstrar que ele já estava separado de fato dessa pessoa”, conta.
Quem já fez o inventário ou o divórcio no cartório
também pode pedir uma certidão com apenas partes das informações. “Agora é
possível que se solicite no cartório, após a lavratura do inventário ou do
divórcio, solicitar uma certidão – não uma certidão cópia integral do
procedimento – pode solicitar uma certidão por requisitos, especificando apenas
os bens, os direitos e obrigações que ela quer dar publicidade. Por vezes, são
muitos imóveis que a pessoa deixou ou no divórcio, a pessoa não quer que onde leve
aquela escritura para produzir efeito, seja no banco, seja no Detran, que
conste todos aqueles bens, que todas as pessoas tenham publicidade em relação
aquilo. Ela pode pedir uma certidão que conste: se eu vou no banco, eu quero
que nessa certidão conste apenas o que decidimos referente às contas bancárias;
no Detran referente aos automóveis. Ficou uma coisa bem bacana, bem restritiva
para resguardar a intimidade das pessoas”, disse.
O cartório ainda oferece a possibilidade de assinar
os documentos online. “Existe até a possibilidade de assinatura dos inventários
e divórcios, qualquer tipo de escritura, pelo E-notariado, que é um sistema
totalmente digital. É só entrar em contato com o cartório que for lavrar
escritura e falar: ‘Eu quero assinar pelo E-notariado’. Você pode assinar do
conforto da sua casa, sem precisar ir no cartório. É uma inovação que também já
existia, mas é uma coisa bem boa”, conta.
Todos os procedimentos precisam ser feitos com
advogados que auxiliam as pessoas a realizarem os serviços nos cartórios. “A
única coisa que não mudou é a necessidade de intervenção de um advogado. A
figura do advogado é muito importante nesse momento porque o advogado está ali
para assessorar as partes, para ajudar a fazer a partilha de bens correta, para
resolver o que tiver que ser resolvido o mais rápido. É importante que o
advogado tenha conhecimento dessas coisas novas para poder levar para os seus
clientes, para a população, para podermos trabalhar em conjunto”, disse.
Fonte: Najua