Notícias

Caso do poeta Antônio Cícero: a relação das Diretivas Antecipadas de Vontade (DAVs) com o direito individual de decidir sobre o próprio fim de vida

Imagem Notícia

Advogada especialista na área do Direito de Família e Sucessões, Karen Perchin Telesca Ramos, fala sobre o papel das DAVs no contexto brasileiro, onde a eutanásia é proibida, entre outros aspectos

Em entrevista ao Colégio Notarial do Brasil – Seção Rio Grande do Sul (CNB/RS), a advogada especialista na área do Direito de Família e Sucessões pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Rio Grande do Sul (FMP/RS), Karen Perchin Telesca Ramos, falou sobre a relação da morte assistida do poeta Antônio Cícero, no último dia 23 de outubro na Suíça, e que trouxe à tona o debate sobre o direito individual de decidir sobre o próprio fim de vida e o papel das Diretivas Antecipadas de Vontade (DAVs), ato realizado no tabelionato de notas.

As Diretivas Antecipadas de Vontade (DAVs) ou Testamento Vital é um instrumento que permite ao paciente, antecipadamente, expressar sua vontade quanto às diretrizes de um tratamento médico futuro, caso fique impossibilitado de manifestar sua vontade em virtude de acidente ou doença grave. Pode ser elaborado por pessoas doentes ou saudáveis e permite a nomeação de um procurador para garantir o cumprimento de suas vontades.

Leia a entrevista completa:

CNB/RS - Qual é o papel das DAVs no contexto brasileiro, onde a eutanásia é proibida?

Karen Telesca - Entendo que o papel das DAVs é permitir que o declarante expresse, desde já, seus desejos e vontades para quando elas não mais forem passíveis de serem expressadas. É o exercício pleno do Princípio da Autonomia da Vontade. Em que pese a eutanásia seja proibida no Brasil, muitas pessoas gostariam de não ter sua vida prolongada no caso de alguma doença irreversível e veem nas DAVs a possibilidade de deixar registrado como querem ser tratados e medicados quando a doença chegar, tendo o não prolongamento da vida como uma opção.

CNB/RS - Considera que as DAVs são uma alternativa relevante para manifestar escolhas sobre tratamentos futuros?

Karen Telesca - Sim, e é a forma mais apropriada para isso, pois simplesmente verbalizar para um parente ou amigo não será suficiente. É preciso documentar da forma mais detalhada possível o que gostaria que fosse feito ou não, como por exemplo, não ser reanimado em caso de parada cardíaca, e confiar a alguém que faça valer tal vontade. Importante referir que é dever do médico lutar pela vida do paciente, mas atualmente também é seu dever respeitar a vontade daquele observadas as Resoluções do órgão de classe.

CNB/RS - Quais situações destaca em que as DAVs podem ser úteis para que uma pessoa tenha suas vontades respeitadas?

Karen Telesca - Podem ser inúmeras as situações que levam uma pessoa a querer expressar suas vontades, mas entendo que elas somente serão úteis se houver tempo hábil entre a formalização da DAV e declaração do médico que a pessoa já não é mais capaz de se expressar sozinha. Defendo, inclusive, que ela não deve ser feita apenas por quem já encontra-se enfermo, mas por qualquer um que pense no futuro, desde que não vá de encontro a algo expressamente proibido por lei. Também há de se levar em conta a fé pública atribuída ao documento realizado junto ao Tabelionato, que dará maior segurança e confiabilidade ao que ali foi declarado do que se for realizada de forma particular. 

CNB/RS - Como as DAVs permitem que uma pessoa exerça autonomia sobre suas decisões de saúde no Brasil?

Karen Telesca - A DAV proporciona à pessoa o exercício pleno do Princípio da Autonomia Privada, indicando nela todas as suas vontades e projeções para seu futuro, tanto quando o assunto for a administração patrimonial durante sua incapacidade, quanto cadavéricos, mas especialmente no que diz respeito à sua saúde. É indicar agora o que deverá acontecer no futuro para o caso de ser acometida por alguma enfermidade incapacitante sem que haja conflitos entre aqueles ditos responsáveis por ela, sejam eles médicos ou familiares. Manifestar o desejo de se submeter ou não a algum tratamento mais invasivo ou manter-se ligado a aparelhos que postergam a vida ainda que sem chance de reabilitação e retomada da consciência são exemplos de escolhas, mas entendo que elas devam ser ponderadas de acordo com o diagnóstico e, sobretudo, o prognóstico do paciente. O Conselho Federal De Medicina editou Resoluções a serem observadas pelos profissionais no que diz com o atendimento às DAV's e por isso é importante contar com o apoio jurídico na confecção para evitar que alguma disposição não possa ser respeitada futuramente.

Fonte: Assessoria de Comunicação – CNB/RS