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Artigo - A atuação do registrador civil na ocorrência de casamento a ser celebrado por procuração (por Cristina Castelan Minatto Graziano*)

O uso da procuração nas celebrações dos casamentos civis, ou mesmo para simplesmente o nubente fazer-se representar no ato de habilitação, não é incomum desde tempos pretéritos em que já se reconhecia a procuração instrumentada como meio próprio de uma pessoa fazer-se representar por outra em determinadas ocasiões. O Direito evoluiu e evolui ainda, em busca de contornar e assegurar as relações sociais e, no caso do instrumento de mandato utilizado para a celebração dos casamentos, não poderia ser diferente. Por ser ato solene, não há que se falar em procuração por instrumento particular, o que não impede que a anterior preparação dos documentos com a formalização da habilitação ao casamento o seja. Ainda, ressalte-se que se o caso de impossibilidade de comparecimento do outorgante for em decorrência de estar em iminente risco de vida, não há que se falar em procuração.
Em poucas linhas, sem assentarmos aqui a evolução do instituto da procuração no Direito Pátrio, fixemos nosso estudo no art. 1542, § 1º do Código Civil, que prevê a revogação do mandato, o que não fazia expressamente o código anterior, ao tratar da procuração no art. 201 (Código de 16).
Se verificarmos o art. 657 do Código vigente, assim como o art. 660, numa leitura conjunta com o art. 1542, sendo oeste tipo de mandato um "negócio imperativo", como cita Nery Jr., (745), o mandato está sujeito a forma solene prescrita em lei e com poderes especiais.
A Desembargadora Maria Berenice Dias, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, trata em item específico a questão da revogação de procuração para celebração de casamento. Pela leitura que se faz da obra da magistrada afirmo que o desconhecimento da desistência do mandante pode ensejar a anulação do casamento, mas se houver a convivência posterior dos contraentes, ostentando a "posse do estado de casados", convalida-se o ato e descabe argüição de anulabilidade do ato de celebração de casamento por qualquer vício, eis que sanado posteriormente. Na verdade, lendo sua obra, constatamos que verificado ato sexual após a celebração do casamento e observando-se o conhecimento público da formação da entidade familiar, há de se ignorar a revogação e reconhecer a validade do casamento. Continua sua argumentação, e aqui tomo suas palavras: "...cabe reconhecer a boa-fé do cônjuge a configurar o casamento putativo com relação a ele. Dispõe o mandante de 180 dias para propor a anulação do casamento, fluindo o prazo da data em que tomou conhecimento de que, mesmo tendo revogado a procuração, ocorreu a celebração do casamento (CC 1.560 2º). O arrependimento, porém gera obrigação indenizatória por perdas e danos (CC 1542 §1º)". (p.244)
Revogado o mandato, portanto, em princípio, deveria ser reconhecida a nulidade absoluta do casamento. No entanto, a lei o tem por anulável (CC 1.550 V). Atentemos para o fato de que a procuração não terá validade por mais de 90 dias, utilizando-se por certo que se a procuração tem poderes também para representar no ato de habilitação ao casamento, poderíamos entender que se ela servirá para a celebração, então a realização do casamento deverá se realizar dentre os 90 dias, contados a partir do dia da entrada nos papéis e não a partir do 16º após este, pois a validade está fixada no art. 1542 §3º. Isto seria uma forma de leitura "ao pé da letra", mas todo cuidado é importante enfatizar, principalmente pelo valor do ato de celebração de casamento, por sua definição de ser ato formal e solene, ou seja, indiscutível pelo julgador na sua formação e celebração; quem dita é a lei, e ela fixou imutavelmente as condições do ato.
Lembremo-nos, apenas para uma apreensão mais eficaz do mandato nas solenidades de casamentos, que "Só por instrumento público se poderá revogar o mandato" (§4º). Esta nota foi feita por Rezende ao tratar da Procuração com poderes especiais. (2006:204)
Por fim, o registrador para ter certeza de que a procuração ainda é vigente e que o casamento não poderá ser objeto de anulação sob esse fundamento poderá, ou deverá, nos termos de algumas determinações normativas das Corregedorias Estaduais, por precaução , confirmar a procedência e a validade do instrumento através de meio idôneo, junto ao Tabelionato que lavrou a procuração, ou Consulado Brasileiro no exterior, se for o caso, comprovando que a mesma não foi revogada ou cancelada, arquivando o comprovante da remessa da confirmação.
Referências Bibliográficas
BRASIL. Lei 3071, de 01 de janeiro de 1916. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil/leis/L3071.htm>. Acesso em 18 de maio de 2008.
CENEVIVA, Walter. Lei dos Registros Públicos Comentada. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 3ª ed. São Paulo: RT, 2006.
MELO JR., Regnoberto Marques de. Lei de Registros Públicos Comentada. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 2003.
NERY JR., Nelson, NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado e legislação extravagante. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
REZENDE, Afonso Celso Furtado de. Tabelionato de notas e o notário perfeito. 4ª ed. Campinas, SP: Millennium Editora, 2006.
RIZZARDO, Arnaldo. Celebração do Casamento. In: Curso de Direito de Família. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2006. Capítulo V. Material da 3ª aula da Disciplina Serviços Registrais Específicos, ministrada no Curso de Especialização Telepresencial e Virtual em Direito Notarial e Registral - UNISUL - REDE LFG.
* a autora é Oficial do Registro Civil das Pessoas Naturais, Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas da Comarca de Içara/SC. Especialista em Direito Imobiliário (Univali) e em Metodologia e Didática do Ensino Superior (Unesc). Contato: oficial@cartorioicara.com.br
Fonte : SIREDOC

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