Conforme a notícia abaixo transcrita, o Ministro Ayres Britto conclamou todos os operadores do direito no Brasil a valorizarem a Constituição.
Segundo o Ministro, “é possível interpretar o sistema normativo com intuição, imaginação e criatividade, tendo em vista a senso de realidade e a sensibilidade social”.
Os notários e registradores são profissionais do direito, como se vê do artigo 3º da Lei Federal 8.935/94. Assim, estamos envolvidos na conclamação feita pelo Ministro.
De fato, notários e registradores são os agentes por excelência da paz social. É que atuamos justamente na seara da prevenção dos conflitos, elaborando atos e negócios jurídicos – ou lhes emprestando especial publicidade, autenticidade, segurança e eficácia – que tem o enorme potencial de evitar o surgimento do conflito ou, caso este surja, de municiar bem o Judiciário, instrumentando-o para bem decidir a lide.
Ademais, em tempos de consagração da função social, econômica e ambiental da propriedade, o Registro de Imóveis surge como a “longa manus” dessa funcionalização, reunindo o aparato necessário para tanto.
Para atender esses novos reclamos sociais, estampados em nossa Carta Maior, notários e registradores devem se especializar cada vez mais, aprofundando-se nos estudos. Isso porque, para além dos tradicionais negócios jurídicos civilistas, cada vez mais seremos chamados para lidar com complexas questões de direito ambiental, urbanístico, administrativo, tributário, matérias ligadas a regularização fundiária, crédito imobiliário, etc.
Temos sido convocados para auxiliar o Judiciário, assumindo algumas atribuições, como conduzir a execução prevista na Lei 9.514/97 (alienação fiduciária), a retificação de imóveis no registro, a usucapião extrajudicial (Lei 11.977/09), inventários, partilhas, separações e divórcios (Lei 11.441/07), etc.
Penso que, como salienta o Ministro Ayres Britto, é tempo de notários e registradores se debruçarem mais sobre a Constituição, aplicando-a e dando-lhe concretude nos seus misteres. Há que se superar o medo de que notários e registradores exerçam na plenitude a Hermenêutica Jurídica dentro de suas atribuições, já que a Lei claramente nos atribui a condição de “profissionais do direito”. Nesse sentido, penso que é o momento de começarmos a debater a superação de eventuais posições contrárias a esse exercício hermenêutico mais denso por nossa parte. Nossas posições poderão ser reformadas pelos órgãos próprios, mas sempre com respeito – espero – à nossa atividade exegética.
E nessa atividade, atendendo à conclamação do Ministro Ayres Britto, espero que cada vez mais vejamos fundamentações em Notas de Devolução, razões de dúvida ou em qualificações positivas (tomara que estas em maior número, já que é o registro que atende a função sócio-econômica da propriedade, e não a manutenção do imóvel na clandestinidade), invocando dispositivos e princípios constitucionais.
Claro que isso demanda um novo enfoque, uma nova forma de pensar o direito registral imobiliário, mas estamos prontos para encarar o desafio.
Confira a íntegra notícia:
“Ayres Britto conclama operadores do direito a valorizar a Constituição
O presidente em exercício do Supremo Tribunal federal (STF), ministro Ayres Britto, participou na noite de ontem (06), da solenidade de abertura do II Congresso Brasileiro das Carreiras Jurídicas de Estado, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães, em Brasília (DF), e ressaltou que a Constituição de 1988 valorizou as carreiras jurídicas, na medida em que reconheceu sua importância para o país. Por isso, para ele, a melhor forma de retribuição que os operadores do Direito podem ter é valorizar o texto constitucional.
‘Essa Constituição desperta em todos nós sentimentos de admiração, reverência e gratidão. E, se queremos ser gratos à Constituição que tanto nos prestigiou como profissionais do Direito, devemos cultuá-la no nosso dia a dia profissional. E é fácil cultuar a Constituição: basta que tenhamos a disposição de interpretrá-la com o pensamento e com o sentimento’, afirmou. Ayres Britto disse que a Carta Magna é do povo enquanto está sendo elaborada, mas depois de promulgada, é tomada pelos juristas e pelos operadores do Direito. Por isso, defendeu que o povo seja mais ouvido, por meio de audiências públicas.
O ministro Ayres Britto afirmou ainda que é possível interpretar o sistema normativo com intuição, imaginação e criatividade, tendo em vista a senso de realidade e a sensibilidade social. Citando Tobias Barreto, o vice-presidente do STF ressaltou que o Direito não é só uma coisa que se sabe, é também uma coisa que se sente. Ayres Britto lembrou que a gênese do substantivo ‘sentença’ vem do verbo sentir. ‘É o sentimento, conjugadamente com o pensamento, que nos habilita a descobrir, nos textos normativos, possibilidades muitas vezes insuspeitáveis para uma análise puramente metódica e científica’, afirmou.
O ministro saudou o presidente da República em exercício, José Alencar, presente à solenidade, destacando sua luta incansável contra as adversidades. ‘Saúdo todos os presentes na pessoa do presidente José Alencar, pela extraordinária trajetória de vida no enfrentamento de problemas pessoais, que são de todos nós conhecidos. Do alto das 15 cirurgias as quais foi submetido nos últimos anos, nos transmite uma preciosíssima lição de vida’, disse Ayres Britto.”
Fonte: STF